domingo, 29 de novembro de 2009

Carta dos Atingidos pelo BNDES

Somos indígenas, quilombolas, camponeses, ribeirinhos, pescadores, trabalhadoras e trabalhadores do Brasil, Equador e Bolívia, reunidos no I Encontro Sul-Americano de Populações Impactadas por Projetos financiados pelo BNDES.
Somos, todas e todos, atingidos por estes projetos, sobre os quais nunca fomos consultados e que são apresentados para nós como empreendimentos que irão trazer progresso e desenvolvimento para o Brasil e para América do Sul. São projetos financiados pelo BNDES, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, voltados para o monocultivo de cana de açúcar e eucalipto, para a produção insustentável de carne, para a exploração de minério, para a construção de fábricas de celulose, usinas de produção de agroenergia, siderúrgicas, hidrelétricas e obras de infraestrutura, como portos, ferrovias, rodovias, gasodutos e mineriodutos. Estes têm afetado direta e profundamente nossas vidas, em especial das mulheres, nos expulsam das nossas terras, destroem e contaminam nossas riquezas, que são os rios, florestas, o ar e o mar, dos quais dependemos para viver, afetam nossa saúde e ampliam de forma permanente a exploração sobre os povos de nossos países.
Os investimentos crescentes do BNDES, que apenas em 2009 podem ultrapassar os R$ 160 bilhões de reais, utilizando recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e do Tesouro Nacional, estão servindo para aumentar os lucros de um grupo reduzido de algumas dezenas de grandes empresas de capital nacional e internacional. Enquanto isso, a apropriação por parte dessas empresas dos nossos territórios, da água, das florestas e da biodiversidade ameaça não só a segurança alimentar das nossas comunidades, mas também a soberania alimentar, mineral e energética dos nossos países. Dessa forma, os financiamentos promovem uma integração da América do Sul que se baseia em uma forte concentração do capital, no controle e na privatização de territórios de uso comum e na exportação dos bens naturais do nosso continente.
Por diversas vezes, buscamos as autoridades para protestar contra o financiamento do BNDES a estes projetos, mas nossos argumentos são invariavelmente desconsiderados. Na verdade, o que constatamos é o comprometimento da grande maioria do Executivo, Legislativo e Judiciário com a defesa destes projetos, que promovem a constante violação dos nossos direitos. Enfrentamos cada vez mais dificuldades para a demarcação de nossas terras indígenas e quilombolas, a realização da reforma agrária e a obtenção de empregos com garantia de direitos, no campo e nas cidades. Denunciamos a verdadeira ofensiva de ameaças, perseguição e criminalização que estamos sofrendo, que já custou a vida de inúmeros companheiros e companheiras na luta pela defesa do nosso território, dos nossos rios, mares e matas.
Nossa troca de experiência explicita que há um bloco, formado por grandes empresas multinacionais, o Estado e os grandes meios de comunicação, que cria, promove e se beneficia dos projetos que o BNDES financia. O principal argumento do BNDES para justificar estes financiamentos – a geração de empregos – é falso. Os projetos financiados destroem milhares de formas de trabalho nas comunidades impactadas e os empregos criados pelos financiamentos, além de insuficientes, aumentam a superexploração do trabalho, o que inclui muitas vezes a prática do trabalho escravo. As grandes obras de infraestrutura e a reestruturação dos processos produtivos, que automatizam e terceirizam a produção, afetam ainda mais os trabalhadores e as trabalhadoras. O resultado é um grande contingente de desempregados e lesionados, com direitos cada vez mais reduzidos.
Nossa luta é pela vida e contra a morte que os projetos do BNDES têm promovido através dos seus financiamentos. Lutamos por uma inversão da lógica de acumulação capitalista e do lucro, causadora da crise ambiental, climática, econômica e social que vivemos, de modo a garantir o respeito à dignidade e à diversidade dos modos de vida das populações sul-americanas.
Perante essa situação, nos comprometemos a:
- Prosseguir em nossa luta em defesa da nossa terra, ar e água, certos de que esta será a principal ferramenta para resistirmos aos projetos financiados pelo BNDES.
- Socializar com nossas comunidades e movimentos e com todo o povo dos nossos países todas as informações e denúncias relatadas neste encontro e incentivar o trabalho de formação nas nossas regiões no Brasil e na América do Sul sobre o papel do BNDES e dos governos que promovem o atual modelo, chamado de desenvolvimento, mas a serviço da acumulação de lucros de grandes empresas multinacionais.
- Articular e fortalecer cada vez mais nossas lutas contra os projetos de barragens, monoculturas, celulose, agrocombustíveis, agropecuária, mineração, infraestrutura e siderurgia, buscando fortalecer nossa resistência.
- Exigir do BNDES critérios socioambientais transparentes que não se restrinjam à legislação ambiental e ao ‘ambientalismo de mercado’, incorporando critérios de equidade que respeitem a diversidade dos modos de vida e de produção já existentes nos territórios. Além disso, exigimos o respeito aos direitos humanos e a aplicação com rigor de todos os tratados e convenções ratificados por nossos países.
- Denunciar as graves conseqüências destes projetos sobre os povos indígenas nos nossos países, apoiar e incentivar as suas lutas contra os projetos que destroem seus territórios, bem como exigir a imediata demarcação e desintrusão das terras indígenas.
- Fiscalizar as irregularidades das empresas financiadas pelo BNDES.
- Exigir do BNDES transparência e acesso irrestrito ao conjunto das informações dos financiamentos.
- Responsabilizar o BNDES e os governos pelos prejuízos causados pelos projetos que o Banco financia e exigir a suspensão do financiamento a empresas que violam direitos, degradam o meio ambiente e as condições de trabalho.
- Fortalecer nossa luta por um projeto popular que possa gerar perspectivas para todos, e principalmente para a juventude, para que não abandonem nossos territórios ameaçados pelos projetos financiados pelo BNDES.
- Lutar, em nossos países, por uma forte integração dos povos, pela economia solidária, pelo respeito aos nossos direitos, pela garantia da nossa soberania, pelo bem-estar das comunidades e pela integridade dos nossos territórios.
- Exigimos que o BNDES seja um instrumento para fortalecer este novo projeto de sociedade.

Rio de Janeiro, 25 de novembro de 2009
Fonte: http://terradedireitos.org.br/biblioteca/carta-dos-atingidos-pelo-bndes/

HONDURAS - Boletim da Resistência



HONDURAS – AMÉRICA LATINA LIVRE BOLETIM DE LUTA – III – 29/11/2009
(Resistência Hondurenha)
A FARSA
Com apoio político, material e militar dos Estados Unidos o governo golpista tenta hoje seu último lance para “legalizar” o golpe de estado que derrubou o presidente constitucional Manuel Zelaya. “Eleições” dirigidas, com cartas marcadas onde o poder, qualquer que seja o vencedor, será sempre dos golpistas. O povo hondurenho está sendo ameaçado, coagido a comparecer para dar números que possam justificar o golpe e permitir que a barbárie ganhe contornos de “democracia”.
Todas as tentativas de retomar a legalidade foram feitas pela Resistência, com amplo apoio popular e não há como reconhecer a legitimidade dessas eleições se restritas aos grupos que controlam as instituições e a economia do país com o apoio das forças armadas ditas hondurenhas. São forças auxiliares do governo dos EUA e subordinadas aos comandantes da base militar norte-americana em Tegucigalpa.
Nós, os resistentes, não pretendemos impor nenhum governo, nenhuma ordem política, econômica e social que não seja o reflexo da vontade dos hondurenhos. Livre, sem a violência da ditadura sob a qual vivemos. Continuaremos a lutar apoiados por povos e governos democráticos da América Latina, de todas as partes do mundo, agora numa etapa diferente, a refundação de Honduras a partir de uma nova carta magna que seja elaborada pela vontade popular expressão numa assembléia nacional constituinte e sem perder de vista que o presidente legítimo dos hondurenhos é Manuel Zelaya.
Para que a farsa se consuma contam com apoio da chamada grande mídia internacional, controlada toda ela pelo capital dos grandes grupos econômicos que sustentam e formam o império norte-americano. Não toleram que deles se discorde, ou que modelos diversos existam no mundo.

A BARBÁRIE ANIMALESCA DOS “PATRIOTAS” FARDADOS
São bárbaros, são cruéis, são cínicos, são covardes e são desumanos. Obama não é diferente de George Bush, só no estilo, no sorriso hipócrita e nos acordos não cumpridos.
Essa característica, que é um desrespeito ao povo hondurenho, por extensão a todos os povos da América Latina, às nações livres do mundo, se mostra na ação criminosa de militares destituídos de princípios, honra e compromissos com o que chamam de pátria, na verdade, a deles, é o soldo que chega de Washington. São répteis na essência da palavra.
Prisões, invasões de domicílios de líderes oposicionista, assassinatos, tortura, estupro, tudo isso é o cotidiano de Honduras desde o golpe em julho.
Hoje a população está sendo coagida a votar por todos os meios de pressão possíveis. Desde ameaças de prisão pura e simples com flagrantes montados, a advertências sob risco de perder empregos com o não comparecimento às urnas, muitas vezes pessoas são presas em casa e levadas a votar – funcionários públicos principalmente – além das fraudes costumeiras de muitos deles votarem várias vezes. Não importa para eles o resultado que já está decidido em cédulas previamente marcadas, mas a presença para justificar ao mundo tamanha ignomínia.
Em todas as ruas de todas as cidades hondurenhas militares armados até os dentes se posicionam, inclusive franco atiradores para que a “democracia” deles se exerça e a farsa se consuma.
A grande mídia ignora isso, pois foi orientada pelas redes CNN e FOX a dizer que tudo é “uma festa democrática”.
Um exército subalterno armado enfrentando um povo desarmado, a típica covardia dos boçais, dos torturadores, dos criminosos assalariados por potência e interesses estrangeiros.
Militares assassinaram Mario Hernández e seu filho Henrý Hernández, de 24 anos. Mario era casado com a candidata a alcaideria (prefeitura) de San Francisco, no departamento de Atlántica. Ambos foram torturados antes de serem executados. O fato aconteceu ontem, 28 de novembro. Não admitem contestações quaisquer que sejam.
Hoje pela manhã duzentos bandoleiros fardados dos golpistas, ditos militares, mas com atitudes animalescas de bestas feras, invadiram o Sindicato dos Trabalhadores de Bebidas e Similares – STIBYS – local de reunião da resistência todos os dias desde o golpe. Pela manhã o esquadrão de assassinos deixou o local, mas lá ficou um jipe com soldados evitando a presença de resistentes.
O jovem Gencis Mario Orlando Umanzor Gutiérrez foi detido na madrugada de 28 para 29 de novembro na operação terror dos militares hondurenhos e levado para local desconhecido. A divulgação dos nomes é importante para que organizações internacionais de direitos humanos possam cobrar medidas de proteção, antes que os prisioneiros sejam assassinados. A prisão foi na colônia Centroamericana de Comayauela. Depois de preso foi entregue à patrulha MO3-03, um dos códigos do terrorismo financiado e montado por Washington.
Os observadores internacionais considerados suspeitos estão confinados em locais onde não podem tomar conhecimento de toda essa barbárie e só aqueles autorizados pelo governo golpista depois de ordens de Washington podem circular por Honduras. A CIA e o MOSSAD trabalham livremente no processo de escravização e brutalização do povo hondurenho e da nação hondurenha. São os tais “conselheiros”.
LISTA JÁ CONHECIDA DE PESSOAS DETIDAS EM 28 DE NOVEMBRO
Marcus Gualan Cortes, detido às 01h50m /am pela Polícia Nacional (esquadrão da morte).
Gustavo Adolfo Cortes Gualan detido às 01h50m/am, pela Polícia Nacional (esquadrão da morte).
Victor Corrales Danly, detido em El Paraíso, às 23horas, pela Polícia Nacional (esquadrão da morte).
Gencis Mario Orlando Umanzor Gutiérrez, Centroamericana, Comayaguela, 02h30/am, militares (soldados supostamente hondurenhos mas controlados pelos EUA).
Humberto Castillo, Oficina Selcon, Tegucigalpa, 6h/am, policiais militares (esquadrão da morte).
As notícias sobre presos e desaparecidos são enviadas pelo CENTRO DE PREVENCION, TRATAMIENTO Y REABILITACION DE LAS VICTIMAS DE LA TORTURA Y SUS FAMILIARES e enviadas por mail a FIAN, organismo da resistência.
O PODER É DO POVO! ZELAYA É O PRESIDENTE. RESISTIMOS A BRUTALIDADE MILITAR DOS EUA!
LEIA TAMBÉM: - Contra a ilegitimidade da eleição, representante da Conlutas leva solidariedade ao povo hondurenho –clique aqui

sábado, 28 de novembro de 2009

I Encontro Mineiro dos Atingidos pela Vale

No dia 28 de novembro será realizado em Belo Horizonte o I EncontroMineiro dos Atingidos pela Vale. A proposta desta atividade é reunir edar voz às comunidades afetadas pela Companhia Vale do Rio Doce em MinasGerais.
A Vale iniciou suas atividades no Brasil e hoje é a responsável por um legado de destruição social e ambiental registrado em vários municípios de Minas Gerais. Os bens naturais disponíveis no estado e aexploração da mão-de-obra são as fontes da riqueza dessa empresa queestá presente nos cinco continentes do mundo.
Os resultados dessa ganância são os graves impactos identificados sobre o meio ambiente e avida das pessoas. Progresso econômico para os municípios, geração de emprego,responsabilidade social e desenvolvimento sustentável fazem parte dacampanha publicitária vinculada pela empresa para convencer comunidades etrabalhadores a aceitarem a mineração, mas o que a realidade comprova éa acentuação de conflitos sociais, econômicos e ambientais quemodificam a qualidade de vida das pessoas.
As desapropriações forçadas, a terceirização com as perdas dos direitos trabalhistas, os constantes acidentes de trabalho, acontaminação e o rebaixamento do lençol freático e a perda dabiodiversidade são exemplos de degradações ocasionadas pelamineração.
Apesar das demissões ocorridas entre 2008 a 2009 sob o argumento da criseeconômica mundial, a empresa segue com os pedidos de licenciamentoambiental – mantendo altos investimentos – para abrir novas lavras em locais ainda preservados como é o caso da mineração pretendida na Serrada Gandarela, contribuinte do abastecimento de água da Região Metropolitana de Belo Horizonte.
Desde a privatização ocorrida em 1997, trabalhadores e comunidades vêm sendo prejudicados pela ganância desta grande empresa capitalista. Os bens naturais do solo brasileiro devem ser patrimônio do povo e não dos acionistas da Vale!
É preciso que o governo federal anule o leilão deprivatização – que foi ilegal – e patrocine a reestatização daVale.
Diante dos conflitos estabelecidos, o Comitê Mineiro dos Atingidos pelaVale, convida: populações, comunidades, trabalhadores, estudantes, professores, movimentos sociais, movimentos sindicais, organizaçõesambientalistas, pastorais, associações comunitárias, igrejas e todos osmineiros a somarem forças contra as degradações sociais, ambientais eeconômicas cometidas em Minas Gerais.
Participe do I Encontro Mineiro dos Atingidos pela Vale, pois o que vale é a vida!
Você sabia que a Vale:
Atua em 12 Estados brasileiros e detêm direito de lavra de 23 milhões de hectares o que corresponde aos estados de Pernambuco, Alagoas, Sergipe e Rio Grande do Norte;
Nos onze anos que se seguiram à privatização seu lucro líquido cresceu 29 vezes;Seu valor de mercado passou de US$8 bilhões para US$125 bilhões;
Que sob o argumento da crise econômica mundial a empresa demitiu cerca de4 mil trabalhadores diretos e 15 mil terceirizados;
Que a Vale consome, sozinha, 5% de toda energia elétrica do Brasil;Que as famílias brasileiras pagam por 100kwh/ mês mais de R$50,00 e aVale paga pelos mesmos 100Kwh/ mês cerca de R$3,30;Nos últimos 12 meses a empresa gastou R$178,8 milhões em propaganda paraenganar comunidade e trabalhadores com o falso discurso de desenvolvimentosustentável;
Trabalhadores e comunidades de várias partes do mundo são explorados poressa empresa;Os trabalhadores do Canadá da Vale Inco estão em greve há mais de cincomeses por melhores condições de trabalho e melhores salários;
A Vale está em Moçambique desde 2004 e seu plano de minerar lugaresatualmente habitados e agricultáveis vai obrigar um elevado número defamílias a abandonar suas terras e casas.
PROGRAMAÇÃO
08:30 às 09:00 Apresentação
09:00 às 09:20 O Trabalho na Mineração – Apresentação: Metabase Itabira
09:20 às 09:40 A mineração e as comunidades atingidas: bairro São Geraldo
09:40 às 10:00 A mineração e o abastecimento público de água: Capão Xavier e Gandarela
10:00 às 11:30 Debate
11:30 às 12:00 Fechamento/ EncaminhamentosI Encontro Mineiro dos Atingidos pela Vale
Data: 28/11 – Sábado Horário: 8hs às 12hs Local: Sind-rede/BH (Av. Amazonas, 491 – sala 1009, próx. à Pça. 7,Centro) Comitê Mineiro dos Atingidos pela Vale Brigadas Populares, CONLUTAS, MAB, Assembléia Popular, Metabase Itabira,Metabase Congonhas, CPT, Articulação Popular São Francisco, Movimentopelas Serras e Águas de Minas, ENE-bio, MTD.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

O exército dos invisíveis em fuga da miséria


Por Daniele Mastrogiacomo - La Repubblica
Os jornais fazem a crônica da crise econômica mundial como mero confronto de estatísticas, sobretudo financeiras. Recuperação em 'L' ou oscilação recessiva em 'W'? No tabuleiro dos números digitais, depois do fundo do poço, a contabilidade flerta com a recuperação. Mas o estrago humano está longe de cicatrizar. Vidas rasas fulminadas por massas de forças invisíveis condensadas em movimentos fulminante de capitais especulativos continuam a perambular pelas bordas da globalização sem um fundo do poço à vista. O IHU de hoje traduz um artigo do La Republica que cuida de jogar um pouco de luz nessa ciranda dos desesperados.

Eles chegam do Zâmbia, do Zimbábue, da Somália e de Guiné-Bissau. Só em Joanesburgo, são quase quatro milhões de clandestinos que constróem novas barracas e esperam por um novo Eldorado. Mas tudo não passa de uma miragem. A reportagem é de Daniele Mastrogiacomo, publicada no jornal
La Repubblica, 23-11-2009. A tradução é de Moisés Sbardelotto, para o IHU Online.
Passaram-se 14 meses, mas ainda estão ali. São dois mil: jovens, magros como fios, olhos vivazes que olham ao redor, em perene movimento em busca de um trabalho, de uma troca furtiva, de um pequeno comércio que os faça comer ainda hoje. E depois muitas mulheres. Também elas jovens, deformadas por maternidades precoces e contínuas, o último neonascido agarrado ao seio, um saco de juta sempre cheio de objetos impensáveis, recolhidos por aí.Muitos se estabeleceram ao longo das grades que protegem a igreja metodista e por trás das grades expõem suas mercadorias.
Frutas secas e frescas, verduras, grãos, cartões telefônicos, canetas, cadernos, blocos de papel. São os invisíveis, os clandestinos, parte daqueles quatro milhões de imigrantes que fugiram dos países que caíram no precipício da inflação e que estão assediados pela miséria. Zimbábue, Zâmbia, Moçambique, Somália, África central para baixo, até a República Democrática do Congo, Guiné-Bissau quase transformada em narco-Estado.Em junho de 2008, estiveram no centro de uma revolta que semeou sangue e morte: dezenas de milhares de sul-africanos, também eles imigrantes tempos antes, colocaram sob ferro e fogo os novos distritos de Joanesburgo em uma guerra entre desesperados que provocou cerca de cem mortos e quase dois mil feridos. Isso até o governo de Jacob Zuma decidir hospedá-los e inseri-los no circuito dos regulares.
A realidade, uma vez terminada a campanha eleitoral, tornou-se mais complicada. Porém, a crise econômica mundial, limitada aqui pelo aumento dos preços das matérias-primas, atingiu as finanças públicas. O desemprego aumentou, a raiva e a frustração entre as camadas mais populares começaram a explodir. Tudo ficou como antes. O Zimbábue não consegue se governar. Assim, o país mais ligado e dependente da África do Sul, considerado tempos atrás como o celeiro do continente, continuou o seu inexorável declínio, entre preços nas alturas e uma repressão brutal. Jacob Zuma continua mediando com um projeto sempre mais evidente: sustentar financeiramente o Zimbábue e englobar um território que não tem mais nenhuma forma de governo.
A principal igreja batista da cidade se encontra no coração do centro, que foi quarteirão da cidade financeira e hoje se transformou no gueto de Joanesburgo. Ao longo da via principal, milhares de homens e mulheres compram e vendem de tudo. Grupos de rapazes e moças se saúdam, gritam, levantam as mãos, assoviam, imersos em uma espécie de mercado alegre e colorido. Tudo aqui é irregular. As pessoas que aqui vivem, os objetos de troca. Alguns vigias estão localizados nas esquinas da rua e nos becos laterais. Sinalizam a chegada da polícia que, uniformizados ou em trajes comuns, avança a pé, munida de cacetetes e luvas de borracha.
As pessoas são paradas ao acaso, empurradas contra um muro, revistadas.Outros são parados com o carro, o porta-malas aberto, os chassis controlados. A cada tempo, o barulho contínuo é interrompido por gritos mais fortes. Rapazes fogem perseguidos por outros, mais velhos. As pistolas ficam nos bolsos, enfiadas nas calças e escondidas pelas camisetas. As armas despontam de noite, quando esse enxame humano se retira para as casas e para os apartamentos ocupados.
Os imigrantes se mantêm à distância. Ficam na guarda do seu pequeno território, que o bispo John McCann, um irlandês branco há 40 anos na África do Sul, lhes concedeu. Ao longo das escadas que levam até o terceiro piso, as pessoas se ajeitam da melhor forma que podem. Diante da grande sala onde se celebra a missa, quatro moças e dois rapazes treinam passos de dança.Outros assistem fascinados. Um rádio com o som estridente dispara as velhas canções de Michael Jackson. Outros grupos mais numerosos discutem em círculos. Há um cheiro acre de urina misturado com lixo. Os muros estão descascando, algumas partes soltas cedem negligentemente. O escritório do bispo encontra-se sob o telhado, fechado por uma porta e por uma grade que é trancada todas as noites.
A sala de espera é uma esquina do corredor. Sobre dois sofás, sentam-se há horas dezenas de mulheres e de homens, cada um com sua história de misérias e de violências, um saco, uma bolsa, documentos protegidos por sacos plásticos rasgados e sujos. Buscam um trabalho, uma recomendação, um canto onde dormir, remédios para doenças crônicas que se arrastam há anos. Uma mulher sorri, canta e pronuncia frases que os outros deixaram de escutar. "Somos 2.200 – diz-nos o bispo – e a cada dia aumentam. As pessoas vão se falando, telefonam para o Zimbábue, convidam amigos e parentes para vir para Joanesburgo. Lá nem se consegue mais comer.
Esta é a última praia ou o novo Eldorado, depende do ponto de vista. Mas todas essas pessoas são uma bomba pronta a explodir de novo".
Fotos: Indymedia África do Sul

Vídeo:Crescemos somente na ousadia

Vídeo feito em homenagem aos 25 anos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) a partir da Marcha Estadual “Maria Cícera Neves”, agosto de 2009. O filme apresenta depoimentos de parceiros e parceiras do movimento, imagens de momentos históricos de sua trajetória e também desta última marcha. Além disso, ele se propõe a refletir sobre a relação do MST com as questões urbanas.


Crescemos Somente na Ousadia from Setor de Comunicação on Vimeo.

Fonte: http://www.mst.org.br/node/7963

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

EUA: Enquanto Nobel da Paz segue as políticas belicistas de Bush alertam Brasil sobre os perigos do Irã


Americano enviou carta para Palácio do Planalto
Na véspera da chegada de Mahmoud Ahmadinejad ao Brasil, o presidente Barack Obama mandou por fax uma carta ao seu colega brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, em que trata, entre outros assuntos, da visita polêmica. A correspondência foi enviada no domingo; o iraniano chegou a Brasília no dia seguinte.
O conteúdo não foi tornado público, mas pessoas que tiveram acesso a ela confirmaram que falava de três outros temas além de Irã: a posiçãoAdicionar imagem dos EUA de apoiar a realização das eleições presidenciais de domingo em Honduras, a reunião de mudança climática que acontece em dezembro em Copenhague e as negociações da Rodada Doha de liberalização do comércio mundial. Brasília ainda decide se responderá.
À Folha, um funcionário da Casa Branca disse: "Temos por política não confirmar nem discutir o conteúdo de correspondências diplomáticas". O Departamento do Estado dos EUA e a Embaixada do Brasil em Washington não quiseram comentar o assunto.
Os quatro temas resumem os pontos recentes de atritos entre os dois países. Sobre Honduras, os EUA justificaram sua posição de apoiar as eleições como maneira de superar a crise do país -a atitude é minoritárias entre os países da região.
Em Brasília, o assessor especial da Presidência para assuntos internacionais, Marco Aurélio Garcia, resumiu o sentimento da relação bilateral ao dizer que há um "sabor de decepção" do Brasil com posições do governo Obama.
Ele citou a posição "equivocada" dos EUA em relação ao golpe em Honduras, o fim da Rodada de Doha praticamente decretada pela carta e a falta de propostas claras para a Conferência do Clima. "Vemos com preocupação alguns posicionamentos dos EUA. Entendemos que o presidente Obama está enfrentando uma situação complexa no seu país, com uma agenda interna complexa, mas a grande verdade é que isso está provocando uma certa frustração", disse Garcia.
Segundo ele, porém, "o governo brasileiro continua com expectativas de que possamos ter um bom relacionamento com EUA, mas há um certo sabor de decepção que nós queremos que seja revertido".
Garcia disse que o Brasil não mudará sua posição de apoio ao presidente deposto de Honduras, Manuel Zelaya, e que vê com preocupação as eleições marcadas para o próximo domingo. Segundo ele, os EUA deveriam ter adotado posição mais dura contra o governo de facto de Roberto Micheletti.
"Achamos que é uma postura equivocada, que os EUA poderiam ter usado em determinado momento pressões mais fortes que eles utilizam em outras circunstâncias para que os golpistas e Micheletti em particular fossem levados para o fundo do cenário". (SIMONE IGLESIAS E SÉRGIO DÁVILA) ( matéria
Folha de São Paulo - 05.11.2009)


Miopes

Os Estados Unidos reiteraram a posição de que não assinarão o tratado internacional de proibição de minas terrestres, anunciou o porta-voz do Departamento de Estado, Ian Kelly.«Decidimos que a nossa política sobre minas terrestres continuará em vigor».
Portanto o senhor que recebeu o Nobel da Paz continuará a política da guerra. Sendo os EUA um dos maiores produtores do mundo, destas minas, seria chato baixar os lucros dos senhores industriais da guerra que dominam o poder norte-americano.
Era chato.
As águas vão-se tornando mais claras.


















Fontes: Folha de São Paulo e Blog ideal-comunista.

PF flagra 530 empregados em condições degradantes

Em Minas, força-tarefa interdita seis fazendas de multinacional francesa LDC. Trabalhadores não tinham água potável, banheiro e equipamentos de proteção de qualidade; empresa não se manifestou sobre o caso

Por BRENO COSTA DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELO HORIZONTE

Cerca de 530 trabalhadores foram flagrados em condições precárias de segurança e saúde em fazendas de cana-de-açúcar arrendadas pela multinacional francesa LDC (Louis Dreyfus Commodities) em quatro municípios de Minas Gerais.
Dez fazendas foram fiscalizadas por uma força-tarefa de Polícia Federal, Ministério do Trabalho e Ministério Público do Trabalho. Seis foram interditadas, além da usina de açúcar e álcool da companhia em Lagoa da Prata (MG). A LDC também tem usinas em SP, MS, RN e PE, administra no Brasil 340 mil hectares de terra e emprega cerca de 20 mil pessoas.
A Polícia Federal diz já ter recebido relatórios de auditores fiscais referentes a 286 trabalhadores, e identificado, na maioria, indícios de exploração de mão de obra em condição análoga à escravidão.
O Ministério Público do Trabalho apresentou à LDC uma proposta de Termo de Ajustamento de Conduta, com pedido de indenização de R$ 2 milhões por danos coletivos. Foram fiscalizadas fazendas em Lagoa da Prata, Luz, Iguatama e Bambuí.
Os trabalhadores em condição irregular não eram diretamente vinculados à LDC, mas a empresas terceirizadas. A LDC disse que só se pronunciará após ser oficialmente informada da inspeção da força-tarefa, entre os dias 9 e 23 deste mês.
Os trabalhadores, que atuavam principalmente na colheita, não tinham água potável, banheiro, local para refeições e equipamentos de proteção de qualidade. Folgas e horas extras não eram respeitadas.
A PF já abriu inquérito para investigar suposto trabalho escravo sob responsabilidade da LDC e de empresas por ela contratadas para adubação, plantio e colheita de cana nas fazendas.
Divergindo da PF, o procurador do Trabalho Alesandro Beraldo afirma que as condições precárias verificadas nas fazendas não chegaram a caracterizar trabalho escravo. Para ele, o caso terá consequências apenas trabalhistas, e não penais.

Fonte: Jornal Folha de São Paulo (25.11.2009)

Será mais uma piada?


Será que o agronegócio vai deixar o governo aplicar a lei?
O MST, a Contag, o MPA, o MAB, a CUT e a CNBB acredita que sim.

Informe MST - por e-mail
Governo reafirma compromisso com a atualização dos índices de produtividade.
Esta manhã, o Fórum Nacional de Reforma Agrária e Justiça no Campo participou de audiência com o governo federal, para apresentar um panorama da situação da Reforma Agrária e denunciar uma ofensiva do latifúndio, em Brasília.
Na presença do ministro Luiz Dulci (Secretaria Geral da Presidência), do presidente do Incra, Rolf Hachbart e do chefe do gabinete da Presidência da República, Gilberto Carvalho, entidades como o MST, Contag, MPA, MAB, CUT, CNBB, entre outros, discutiram o andamento da Reforma Agrária no País.
Os movimentos populares denunciaram a ofensiva dos latifundiários, com a apresentação de projetos o Congresso para tirar do Poder Executivo a responsabilidade de fazer a desapropriação de terras e a atualização dos índices de produtividade, a criação de uma CPI contra a Reforma Agrária e as propostas dos ruralistas de mudanças do Código Florestal.
“Os movimentos sociais cobraram do Governo a continuidade e o aprofundamento das medidas para a realização da Reforma Agrária, como a atualização dos índices de produtividade, desenvolvimento dos assentamentos, a desapropriação de latifúndios e o assentamento das famílias acampadas”, disse José Batista de Oliveira, da coordenação nacional do MST.
Durante a reunião, os representantes do Governo reafirmaram o compromisso do Presidente Lula com a atualização dos índices de produtividade. Um próximo encontro foi marcado para o dia 15 de dezembro para dar continuidade às avaliações do andamento da Reforma Agrária no ano de 2009 e perspectivas para 2010.Uma carta de reivindicações, dentre elas o cumprimento do que determina a Constituição a respeito das áreas indígenas e de quilombolas, a efetivação de um controle rigoroso dos agrotóxicos, a aprovação da PEC do trabalho escravo e o estabelecimento de um limite para a propriedade da terra, também foi entregue.
Entidades que compõem o FNRA: CONTAG - MST - FETRAF Brasil - CUT - CPT - CÁRITAS BRASILEIRA - MMC - MPA - MAB - CMP - CONIC - CONDSEF - Pastorais Sociais da CNBB - MNDH - MTL - ABRA - ABONG - APR - ASPTA - ANDES - Centro de Justiça Global - CESE - CIMI - CNASI - DESER - ESPLAR - FASE - FASER – FEAB - FIAN-Brasil - FISENGE - IBASE - IBRADES - IDACO - IECLB - IFAS - INESC - MLST - PJR - REDE BRASIL sobre Instituições Financeiras Multilaterais - Rede Social de Justiça e Direitos Humanos - RENAP - SINPAF - TERRA DE DIREITOS - EMPÓRIO DO CERRADO - COIABE - ABRANDH - ABEEF - Comissão de Justiça e PAZ - Grito dos Excluídos - Jubileu Sul/Brasil - Mutirão Nacional pela Superação da Miséria e da Fome.
Enquanto isso a própria CPT divulga os índices atuais de violência no Campo.
A CPT Nacional divulgou, no dia 23 de novembro, os dados parciais de conflitos e violência no campo referente ao período de janeiro a 15 de novembro, desse ano. Sob o título “Sintonia entre capital e Estado mantém a violência no campo”, os dados revelam que os conflitos e a violência continuam ameaçando a vida do povo do campo. Em relação ao mesmo período do ano passado, o número de conflitos diminuiu de 942 em 2008, para 731 em 2009; as ocupações se mantiveram praticamente estáveis, com 231 esse ano; os acampamentos diminuíram de 37 para 32; as torturas aumentaram de 3 para 20 e os assassinatos mantiveram em 20 (existem assassinatos em investigação, que não foram contabilizados). Para conferir os dados, na íntegra, acesse o site da CPT (www.cptnacional.org.br).
Conclusão: Não podemos esperar mais: “QUEM SABE FAZ A HORA, NÃO ESPERA ACONTECER!”

"Hidrelétricas do bem", bem mal!

Está em várias revistas de circulação nacional um lindo encarte sobre "Um novo conceito em hidrelétricas", as "hidrelétricas do bem". O folheto se foca no chamado complexo do Tapajós e suas 5 barragens e ainda na UH de Belo Monte, no rio Xingú.Fale-se na "potência" dos projetos, no "respeito ao meio ambiente" e no "público" a ser atendido.
Encontrei no Blog da Telma Monteiro, uma boa análise das mentiras. Reproduzo-a abaixo: Eletrobrás elaborou cartilha com propaganda enganosa sobre projetos de hidrelétricas no rio Tapajós
A Eletrobrás fez uma espécie de cartilha com material publicitário patrocinado pelo Ministério de Minas e Energia (MME) em que apresenta “um novo conceito em hidrelétricas” inspirado em plataformas de exploração de petróleo em alto mar.Seria hilário se não fosse trágico. As autoridades do governo federal em especial do MME e da Casa Civil estão tão embriagadas com essa orgia energética que acabam ficando criativos. A Eletrobrás está apresentando nesse folhetim uma chamada “inovação” na construção de hidrelétricas na Amazônia. O tom é de ufanismo, tipo, “hidrelétricas do bem” (isso significa que para eles as outras que estão sendo construídas não são) ou “desmatamento cirúrgico” (inspirado no Bush) ou ainda “reflorestamento radical”.Essa peça publicitária com propaganda enganosa será distribuída à população na região do Tapajós.
O conteúdo, além de conter frases de efeito, é subliminar, faz crer que a construção é iminente, passa batido sobre o processo de licenciamento ambiental e tem ilustrações que levam a falsa impressão de que não haverá impactos ambientais e sociais graças ao novo conceito de “usinas plataforma”.
Para acessar a cartilha enganosa da Eletrobrás, clique aqui

Procuradores denunciam atraso na regularização de terras de Quilombos

Ministério Público abre inquérito sobre quilombos

Por Ricardo Brandt
O Ministério Público Federal abriu inquérito civil para investigar suposta violação por parte do governo federal dos direitos fundamentais das comunidades quilombolas do País, em especial quanto à posse de terras. Além de denunciar atraso nos processos de regularização fundiária, o inquérito aponta a falta de recursos e de estrutura do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) para atuar nos estudos de reconhecimento das áreas.
No documento, assinado por seis procuradores e pela vice-procuradora-geral da República, Deborah Duprat Pereira, o Ministério Público Federal afirma que a União "expediu apenas 105 títulos de propriedade de terras" para quilombolas, em 21 anos de Constituição. "O governo, por um lado, tem assinado documentos e tenta mostrar que cumpre suas políticas públicas, mas há pouco avanço na questão. São 105 títulos, sendo que existem 3 mil comunidades quilombolas", afirma o procurador regional da República Walter Claudius Rothemburg.
Para os procuradores, "o quadro geral relativo às políticas públicas voltadas ao atendimento da população quilombola, em especial da sua garantia do direito à terra, é alarmante, e denota grave e sistemática violação a direitos fundamentais". A Constituição e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) asseguram às comunidades remanescentes dos quilombos o direito às terras que ocupam.
Entre 2004 e 2008 (com exceção de 2006) o porcentual de execução orçamentária referente ao pagamento de indenização aos ocupantes das terras demarcadas e tituladas foi de 0%, segundo os procuradores.
O presidente do Incra, Rolf Hackbart, afirmou que o governo tem a questão dos quilombolas como prioridade. Para ele, a assinatura ontem dos 30 decretos reconhecendo áreas de quilombolas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva prova isso. "Estamos pagando uma dívida histórica com essas comunidades." Hackbart disse que o órgão contratará mais 60 antropólogos para acelerar o reconhecimento das terras.
Fonte: Estadão, 21.11.2009

A HISTÓRIA POR TRÁS DA DAMA DA BANCADA RURALISTA: REVISTA CARTA CAPITAL DESNUDA A VIDA DE KÁTIA ABREU


Golpe contra camponeses

Conflito – Uma reforma agrária às avessas tirou terras de pequenos agricultores e as entregou a figurões como a senadora Kátia Abreu

POR LEANDRO FORTES, DE CAMPOS LINDOS (TO)
Em dezembro passado, a senadora Kátia Abreu, do DEM Tocantins, assumiu a presidência da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA) com um discurso pretensamente modernizador. Previa uma nova inserção social dos produtores rurais por meio de “rupturas” no modo de se relacionar com o mercado, o consumidor, o governo e a economia global. Pretendia, segundo ela mesma, “remover os preconceitos” que teriam isolado os ruralistas do resto da sociedade brasileira e cravado neles a pecha de “protótipos do atraso”. Diante de uma audência orgulhosa da primeira mulher a assumir o comando da CNA, Kátia concluiu: “Somos o que somos e não quem nos imaginam (sic)”. Foi efusivamente aplaudida. E tornou-se musa dos ruralistas.
Em dezembro passado, a senadora Kátia Abreu, do DEM Tocantins, assumiu a presidência da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA) com um discurso pretensamente modernizador. Previa uma nova inserção social dos produtores rurais por meio de “rupturas” no modo de se relacionar com o mercado, o consumidor, o governo e a economia global. Pretendia, segundo ela mesma, “remover os preconceitos” que teriam isolado os ruralistas do resto da sociedade brasileira e cravado neles a pecha de “protótipos do atraso”. Diante de uma audiência orgulhosa da primeira mulher a assumir o comando da CNA, Kátia concluiu: “Somos o que somos e não quem nos imaginam (sic)”. Foi efusivamente aplaudida. E tornou-se musa dos ruralistas.
Talvez, em transe corporativo, a platéia não tenha percebido, mas a senadora parecia falar de si mesma. Aos 46 anos, Kátia Abreu é uma jovem liderança ruralista afeita à velha tradição dos antigos coronéis de terras, embora, justiça seja feita, não lhe pese nos ombros acusações de assassinatos e violências outras no trato das questões agrárias que lhes são tão caras. A principal arma da parlamentar é o discurso da legalidade normalmente válido apenas para justificar atos contra pequenos agricultores.
Com a espada da lei nas mãos, e com a aquiescência de eminências do Poder Judiciário, ela tem se dedicado a investir sobre os trabalhadores sem-terra. Acusa-os de serem financiados ilegalmente para invadir terras Brasil afora. Ao mesmo tempo, pede uma intervenção federal no estado do Pará e acusa a governadora Ana Júlia Carepa de não cumprir os mandados de reintegração de posse expedidos pelo Judiciário local. O foco no Pará tem um objetivo que vai além da política. A senadora, ao partir para o ataque, advoga em causa própria.
Foram ações do poder público que lhe garantiram praticamente de graça extensas e férteis terras do Cerrado de Tocantins. E mais: Kátia Abreu, beneficiária de um esquema investigado pelo Ministério Público Federal, conseguiu transformar terras produtivas em áreas onde nada se planta ou se cria. Tradução: na prática, a musa do agronegócio age com os acumuladores tradicionais de terras que atentam contra a modernização capitalista do setor rural brasileiro.
De longe, no município tocantinense de Campos Lindos, a mais de 1,3 mil quilômetros dos carpetes azulados do Senado Federal, ao saber das intenções de Kátia Abreu, o agricultor Juarez Vieira Reis tentou materializar com palavras um conceito que, por falta de formação, não lhe veio à boca: contras-senso.
Expulso em 2003 da terra onde vivia, graças a uma intervenção política e judicial capitaneada pela senadora do DEM, Reis rumina o nome da ruralista como quem masca capim danado. Ao falar de si mesmo, e quando pronuncia o nome Kátia Abreu, o camponês de 61 anos segue à risca o conselho literal da própria. Não é, nem de longe, quem ela imagina.
Em 2002, Reis foi expulso das terras onde havia nascido em 1948. Foi despejado por conta de uma reforma agrária invertida, cuja beneficiária final foi, exatamente, a senadora. Classificada de "grilagem pública" pelo Ministério Público Federal do Tocantins, a tomada das terras de Reis ocorreu numa tarde de abril daquele ano, debaixo da mira das armas de quinze policiais militares sob as quais desfilaram, como num quadro de Portinari, o agricultor, a mulher Maria da Conceição, e dez filhos menores. Em um caminhão arranjado pela Justiça de Tocantins, o grupo foi despejado, juntamente com parte da mobília e sob um temporal amazônico, nas ruas de Campos Lindos. "Kátia Abreu tem um coração de serpente", resmunga, voz embargada, o agricultor, ao relembrar o próprio desterro.
Em junho de 2005, Reis reuniu dinheiro doado por vizinhos e amigos e foi de carona a Brasília a fim de fazer, pessoalmente, uma reclamação na Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados. Na capital federal, alojou-se na casa de amigos, no miserável município goiano de Águas Lindas, e se alimentou de restos de almoço servido numa pensão da cidade.
Aos técnicos da comissão apresentou documentos para provar que detinha a posse da terra em questão de 545 hectares, desde 1955, parte da fazenda Coqueiros, de propriedade da família, numa região conhecida como Serra do Centro. De acordo com a documentação apresentada pelo agricultor, uma ação de usucapião da fazenda havia sido ajuizada em agosto de 2000.
Após esse ajuizamento, um vizinho de Reis, o também agricultor Antônio dos Santos, ofereceu-lhe para venda de uma área contígua de 62 hectares, sob sua posse havia onze anos, cuja propriedade ele alegava ser reconhecida pelo governo de Tocantins. O negócio foi realizado verbalmente por 25 mil reais como é costume na região até a preparação dos papéis. Ao estender a propriedade, Reis pretendia aumentar a produção de alimentos (arroz, feijão, milho, mandioca, melancia e abacaxi) de tal maneira de sair do regime de subsistência e poder vender o excedente.
Ele não sabia, mas as engrenagens da máquina de triturar sua família haviam sido acionadas uns poucos anos antes, em 1996, por um decreto do então governador do Tocantins Siqueira Campos (PSDB). O ato do tucano, mítico criador do estado que governou por três mandatos, declarou de “utilidade pública”, por suposta improdutividade, um área de 105 mil hectares em Campos Lindos para fins de desapropriação. Protocolada pela comarca de Goiatins, município ao qual Campos Lindos foi ligado até 1989, a desapropriação das terras foi tão apressada que o juiz responsável pela decisão, Edimar de Paula, chegou à região em um avião fretado apenas para decretar o processo. O magistrado acolheu um valor de indenização irrisório (10 mil reais por hectare), a ser pago somente a 27 produtores da região.
Do outro lado da cerca ficaram 80 famílias de pequenos agricultores. A maioria ocupava as terras a pelo menos 40 anos de forma “mansa e pacífica”, como classifica a legislação agrária, cujas posses foram convertidas em área de reserva legal, em regime de condomínio, sob o controle de grandes produtores de soja. Na prática, os posseiros de Campos Lindos passaram a viver como refugiados ilegais nessas reservas, torrões perdidos na paisagem de fauna e flora devastados de um Cerrado em franca extinção. Sobre as ruínas dessas famílias, o governador Siqueira Campos montou uma confraria de latifundiários alegremente formada por amigos e aliados. A esse movimento foi dado um nome: Projeto Agrícola de Campos Lindos.
Em 1999, quatro felizardos foram contemplados com terras do projeto ao custo de pouco menos de 8 reais o hectare (10 mil metros quadrados), numa lista preparada pela Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Tocantins (Faet). A federação teve o apoio da Companhia de Promoção Agrícola (Campo), entidade fundada em 1978, fruto do acordo entre consórcios que implantaram o Programa de Cooperação Nipo-Brasileira para o Desenvolvimento dos Cerrados (Prodecer) em parceria com o Banco do Brasil e com cooperativas de produtores.
Escrúpulos às favas, os dirigentes de ambas as instituições se esbaldaram nas posses de Campos Lindos. À época, a presidente da Faet era ninguém menos que Kátia Abreu, então deputada federal pelo ex-PFL. No topo da lista, a parlamentar ficou com um lote de 1,2 mil hectares. O irmão dela, Luiz Alfredo Abreu, abocanhou uma área do mesmo tamanho. O presidente da Campo, Emiliano Botelho, também não foi esquecido: ficou com 1,7 mil hectares.
Dessa forma, um ambiente de agricultura familiar mantido ao longo de quase meio século por um esquema de produção de alimentos de forma ecologicamente sustentável foi remarcado em glebas de latifúndio e entregue a dezenas de indivíduos ligados ao governador Siqueira Campos. Entre elas também figuraram Dejandir Dalpasquale, ex-ministro da Agricultura do governo Itamar Franco, Casildo Maldaner, ex-governador de Santa Catarina, e o brigadeiro Adyr da Silva, ex-presidente da Infraero. Sem falar numa trupe de políticos locais, entre os quais brilhou, acima de todos, a atual presidente da CNA.
O resultado dessa política pode ser medido em números. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a produção de soja em Campos Lindos cresceu de 9,3 mil toneladas, em 1999, para 127,4 mil toneladas em 2007. Um crescimento de 1.307% em apenas oito anos. O mesmo IBGE, contudo revela a face desastrosa desse modelo de desenvolvimento. No Mapa da Pobreza e Desiguldade, divulgado também em 2007, o município apareceu como o mais pobre do País. Segundo o IBGE, 84% da população vivia da pobreza, dos quais 62,4% em estado de indigência.
No meio das terras presenteadas por Siqueira Campos a Kátia Abreu estava justamente o torrão de Reis, a fazenda Coqueiro. Mas, ao contrário dos demais posseiros empurrados para para as reservas do Cerrado, o agricultor não se deu por vencido. Tinha a favor dele documentos de propriedade, um deles datado de 6 de setembro de 1958 e originário da Secretaria da Fazenda de Goiás, antes da divisão do estado. O documento reconhece as terras da família em nome do pai, Mateus Reis, a partir dos recibos dos impostos territoriais de então. De posse dos papéis, o pequeno agricultor tentou barrar a desapropriação na Justiça. A hoje senadora partiu para a ofensiva.
Em 11 de dezembro de 2002, Kátia Abreu entrou com uma ação de reintegração de posse em toda a área, inclusive dos 545 hectares onde Reis vivia havia cinco décadas. Ela ignorou a ação de usucapião em andamento, que dava respaldo legal à permanência dos Reis na terra. Para fundamentar o pedido de reintegração de posse, a então deputada alegou em juízo que Reis, nascido e criado no local, tinha a posse da fazenda Coqueiro por menos de um ano e um dia, providencial adequação ao critério usado na desapropriação.
Para comprovar o fato, convocou testemunhas que moravam a mais de 800 quilômetros da área de litígio. Incrivelmente, a Justiça de Tocantins acatou os termos da ação e determinou que a expulsão da família de Reis da fazenda Coqueiro e dos 62 hectares recém-comprados. Ignorou, assim, que a maior parte das terras utilizada há 50 anos ou, no mínimo, há mais de dois anos, como ajuizava o documento referente ao processo de usucapião. Reis foi expulso sem direito a indenização por qualquer das benfeitorias construídas ao longo das cinco décadas de ocupação da terra, aí incluídos a casa onde vivia a família, cisternas plantações (mandioca, arroz e milho), árvores frutíferas, pastagens, galinhas, jumentos e porcos.
A exemplo da Kátia Abreu, os demais agraciados com as terras tomadas dos agricultores assumiram o compromisso de transformar as terras produtivas em dois anos. O prazo serviu de álibi para um ação predatória dos novos produtores sobre o Cerrado e a instalação desordenada de empresas e grupos ligados ao mercado da soja. Até hoje a questão do licenciamento ambiental da área abrangida pelo Projeto Agrícola Campos Lindos não foi resolvida por órgãos ambientais locais. Mas nem isso a senadora fez..
Signatário, com outros três colegas, de um pedido de intervenção federal no Tocantins em 2003, justamente por causa da distribuição de terras de Campos Lindos feita por Siqueira Campos a amigos e aliados, o procurador federal Alvaro Manzano ainda espera uma providência. “Houve uma inversão total do processo de reforma agrária. A desapropriação foi feita para agradar amigos do rei.”
Há cinco meses, o agricultor Reis voltou à Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados. Ele luta pra forçar o Tribunal de Justiça de Tocantins a julgar tanto a ação de usucapião de 2000 como o pedido de liminar impetrado há seis anos para garantir a volta da família, hoje acrescida de 23 netos, à fazenda Coqueiro. “Não tem força no mundo, moço, que faça essa Justiça andar”, reclama o agricultor. Ele atribuiu a lentidão à influência da senadora no Judiciário local. Procurada por Carta Capital, Kátia Abreu não respondeu ao pedido de entrevista.
Quatro anos atrás, a família Reis conseguiu se alojar numa chácara de 42 hectares ocupada por um dos filhos há dez anos. Lá, quase vinte pessoas vivem amontoadas em uma casa de dois cômodos, feita de sapê e coberta de palha de babaçu em meio a porcos, galinhas e cachorros. No terreiro coberto da residência, infestado de moscas, as refeições são irregulares, assim como os ingredientes dos pratos, uma mistura aleatória de arroz, mandioca, pequi, abacaxi, feijão e farinha.
Toda vez que um motor de carro é ouvido nas redondezas, todos se reúnem instintivamente nos fundos da casa, apavorados com a possibilidade de um novo despejo. Cercado de filhos e netos, Reis não consegue esconder os olhos marejados quando fala do próprio drama. “Fizeram carniça da gente. Mas não vou desistir até recuperar tudo de novo.”
Em 19 de junho, um dia após a última visita de Reis à Câmara dos Deputados, o presidente da Comissão de Direitos Humanos, Luiz Couto (PT-PB), encaminhou um ofício endereçado ao Conselho Nacional de Justiça para denunciar a influência de Kátia Abreu na Justiça do Tocantins e pedir celeridade nos processos de Reis. O pedido somente agora entrou na pauta do CNJ, mas ainda não foi tomada nenhuma medida a respeito. Nos próximos dias, corregedor do conselho, Gilson Dipp, vai tornar público o relatório de uma inspeção realizada no Tribunal de Justiça do Tocantins, no qual será denunciada, entre outros males, a morosidade deliberada em casos cujos réus são figuras políticas proeminentes no estado.
Há três meses, ao lado de uma irmão e um filho, Reis voltou à fazenda Coqueiro para averiguar o estado das terras depois da ocupação supostamente produtiva da senadora. Descobriu que nem um pé de soja - nem nada – havia sido plantado no lugar. “Desgraçaram minha vida e da minha família para deixar o mato tomar conta de tudo”, conta Reis.
Com o auxílio de outros filhos, recolheu tijolos velhos da casa destruída pelos tratores da parlamentar do DEM e montou um barraco sem paredes, coberto de lona plástica e palha. Decidiu por uma retomada simbólica da terra, onde reiniciou um roçado de mandioca. Na chácara do filho, onde se mantém como chefe da família, ainda tem tempo para rir das pirraças de uma neta de apenas 4 anos. Quando zangada, a menina não hesita em disparar, sem dó nem piedade, na presença do avó: “Meu nome é Kátia Abreu”.
Fonte: Portal Cleber Toledo

Texto Reproduzido de: http://www.azulmarinhocompequi.com/2009/11/historia-por-tras-da-dama-da-bancada.html

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Filme “Quanto vale ou é por quilo?”

Este filme faz uma analogia entre a antiga escravidão como comércio e a atual exploração da miséria pelo marketing social. Apresenta fatos reais sobre muitos episódios que aconteceram, mostrando-nos como hoje, mesmo que a escravidão não exista mais, a exploração de muitas empresas de voluntariado acabam sendo somente uma fachada, querendo passar uma imagem para todos, ao invés de estarem apenas se preocupando em ajudar mesmo quem necessita. As organizações não-governamentais acabam sendo vistas como grandes empresas que aproveitam da miséria para ganhar dinheiro e prestígio, cometendo preconceito e não se importando com o que realmente está acontecendo. Estas empresas querem apenas a ascensão social e mostrar para a população do jeito mais banal e “ensaiado” como eles agem dentro da empresa voluntária. Uma quetão de muita relevância apresentada no filme pelo ator Lázaro Ramos é a seguinte: “O que vale é ter liberdade para consumir, essa é a verdadeira funcionalidade da democracia”, que está no vídeo á seguir:



Agora, eu coloquei um vídeo que mostra uma pequena parte do filme, representando bem o que eu acabei de falar. Esta cena apresenta uma empresa de voluntariado que está fazendo tipo um comercial para mostrar para a população como é o seu trabalho e com quem eles trabalham. Para isso, a tal empresa mandou pegar muitas imagens de negros, para, de algum modo, chocar a população apresentando negros para esta finalidade



Eu recomendo este filme para todos aqueles que quisérem entender mais sobre este tema.

Quando o Estado compensa sua ausência com força



Por Michelle Amaral da Silva e Patrícia Benvenuti

Se o poder público não tomar medidas para conter a especulação imobiliária nas cidades, a tendência é de que aumentem as tensões entre moradores de áreas periférias e forças policiais.O alerta é do professor do Departamento de Economia da Puc-SP e secretário-adjunto de Finanças da Prefeitura de São Bernardo do Campo, Ricardo Gaspar.
Para o especialista, o interesse econômico sobre as favelas, combinado com a omissão do Estado, contribuem para a insatisfação crescente de seus habitantes e, em situações extremas, resultar em confrontos violentos, como os que ocorreram, neste ano, em Heliópolis e Paraisópolis."O desenvolvimento urbano e o mercado imobiliário acabam levando essas populações a se tornarem cada vez mais excluídas, cada vez mais isoladas do ponto de vista dos benefícios que a cidade deve propiciar para os seus habitantes", afirma. Na entrevista a seguir, Gaspar fala sobre a necessidade de políticas que, além de regulamentar, possam integrar mais o espaço urbano.

Brasil de Fato - Como avalia essa intensificação de confrontos em São Paulo entre forças de segurança e moradores de comunidades pobres?
Ricardo Gaspar - Esse é um problema crônico de todas as cidades mais importantes do planeta hoje, que passam por uma transformação bastante profunda na sua estrutura econômica, diminuição de empregos industriais, aumento de empregos em serviços, precarização da força de trabalho e vulnerabilidade da moradia. São três elementos que eu queria destacar, esse é o primeiro. O segundo é o fato de que os governos locais das cidades são, por si só, incapazes de resolver esse problema se não tiverem um apoio forte, uma institucionalidade regional e um apoio do governo federal para isso. Em terceiro lugar, apesar das cidades não poderem fazer muita coisa, [elas] podem fazer, sim, ações importantes, e a cidade de São Paulo não está fazendo isso, pelo menos na direção correta. São ações não só no sentido de propiciar maior número de moradias, condições mais adequadas de moradia, como também planos para a cidade, planos mais democráticos, que prevejam maior mistura de usos, acessos mais fáceis à população de baixa renda aos serviços públicos e equipamentos públicos. Isso não está sendo feito pela atual administração.

Brasil de Fato - Qual a relação entre esses acontecimentos e a dinânica de ocupação na cidade?
Ricardo GasNegritopar -A cidade de São Paulo tem atravessado uma série de mudanças nos últimos 20 anos principalmente. Agora, uma das mudanças, e de caráter negativo, é que aumentou muito o número de favelas e ocupações precárias. As favelas hoje estão espalhadas pela cidade, não é apenas na periferia mais distante. As favelas estão próximas do centro da cidade, os cortiços estão disseminados, e assim por diante. Então compete ao poder público uma política de regularização de áreas, de diversificação de uso para fazer com que essas áreas sejam menos excluídas, porque são ilhas de exclusão no todo social. Todo o desenvolvimento urbano e o mercado imobiliário acabam levando essas populações a se tornarem cada vez mais excluídas, cada vez mais isoladas do ponto de vista dos benefícios que a cidade deve propiciar para os seus habitantes.

Brasil de Fato - Qual o peso do mercado imobiliário nessa dinâmica?
Ricardo Gaspar -O mercado imobiliário atua como sempre atuou historicamente, ainda mais em um país de tradição patrimonialista como o Brasil, mas o mercado imobiliário tem sido uma das principais fronteiras de valorização do capital recente. Até por conta do peso maior das finanças na economia. Então basta ver que as principais crises internacionais, inclusive essa aí mais recente, tiveram no mercado imobiliário sua manifestação e sua expressão mais fortes. O mercado imobiliário tem sido, de fato, fonte de lucros extraordinários e de investimentos de grandes personagens econômicos, grandes bancos, financeiras e assim por diante, grandes investidores. Então o mercado imobiliário atua para valorizar o solo e construir naqueles lugares onde a demanda é maior e também a solvabilidade, ou seja, a maior capacidade aquisitiva de seus habitantes. Se não tiver um contrapeso do poder público, o mercado imobiliário vai atuar sempre na direção de provocar maior separação entre os habitantes de uma cidade. E na realidade aqui, no Brasil, tivemos avanços importantes a partir do início dessa década, com o Estatuto da Cidade, com os Planos Diretores. Mas ainda é preciso fazer muito mais, principalmente do ponto de vista da criação de instituições regionais que consigam regular e fazer prevalecer o interesse público na produção do espaço urbano.

Brasil de Fato -Qual o papel do Estado nesse processo? Mecanismos como o Estatuto da Cidade e os Planos Diretores vem sendo cumpridos como deveriam e tem sido suficientes?
Ricardo Gaspar -[Esses mecanismos] vêm sendo cumpridos na maioria das cidades que são obrigadas constitucionalmente a elaborar Planos Diretores Participativos, alguns nem tão participativos assim, mas têm feito. Acho que houve avanços no planejamento urbano com esse caráter mais democrático das cidades, mas é pouco. Nosso déficit nessa área é tão grande, e a ausência do Estado é tão secular, ao longo de toda a história brasileira, que recuperar esse terreno perdido não é fácil. O governo federal tem feito muita coisa, mas ainda é insuficiente. Me parece que uma das principais deficiências em um plano, digamos, mais macro, é a ausência de programas de natureza mais abrangente de recuperação urbana, de políticas urbanas de caráter mais abrangente. O Ministério das Cidades foi um grande avanço, mas eu acho que ainda precisa extrapolar a visão exclusivamente local dos fenômenos. Os Planos Diretores são muito valiosos, são instrumentos valiosos de regulação urbana, só que eles são muito pulverizados. A responsabilidade de São Paulo termina na fronteira, que às vezes é apenas uma rua, e depois do outro lado da rua é outro município que pode ter outro tipo de orientação política, que pode ter outro tipo de orientação urbanística. As duas entidades muitas vezes não conversam, não tem nenhuma instituição que faça as vezes de uma entidade metropolitana. Acho que as metrópoles têm que ter maior expressão para trabalhar essas políticas não apenas habitacionais como de segurança, ambiental etc. Nós vivemos um grande vazio institucional nessa área.

Brasil de Fato - Sobre esse vazio, que instrumentos a especulação tem usado em seu favor?
Ricardo Gaspar -Exatamente essa ausência e as características históricas da expansão imobiliária fazem com que, por um lado, a especulação imobiliária jogue e compre terrenos vazios em áreas centrais, buscando a sua valorização. O Estatuto da Cidade gera hoje mecanismos para que o poder público possa combater, mas isso ainda não tem sido plenamente utilizado. Precisa de regulamentação, precisa de governos que, de fato, implementem, por exemplo, instrumentos como o IPTU progressivo (XX). Isso por um lado, e por outro, aí já é histórico, as cidades tendem a se expandir horizontalmente, e a especulação imobiliária joga exatamente com a valorização de áreas por conta do poder público ter, necessariamente, de levar água, esgoto, coleta de lixo, equipamentos públicos, saúde, educação a localidades cada vez mais distantes. Com isso se valoriza a terra, e por intermédio de processos diversos que incluem inclusive a grilagem, posse ilegal, loteamentos clandestinos. A especulação imobiliária também lucra com essa expansão desordenada do espaço urbano por conta não só de mecanismos de mercado mas também por conta da ausência de instrumentos mais eficazes de instituições mais efetivas do poder público que regulem essa expansão desordenada.

Brasil de Fato - Em relação às ocupações policiais principalmente em áreas pobres, o senhor avalia que tem sido um fenômeno crescente?
Ricardo Gaspar -Ele [mecanismo] sempre existiu, em alguns casos com um grau de repressão maior, inclusive como em Salvador, com um enorme componente racial. Muda de figura com a evolução dos tempos, mas infelizmente, no nosso país, a questão social ainda continua sendo um caso de polícia. Eu não sou pessimista nesse aspecto, acho que há grandes avanços, acho que até o próprio governo federal hoje faz muito no sentido de tentar reverter isso, mas é uma situação histórica. Não vai ser revertido em dois, três ou quatro mandatos presidenciais ou três ou quatro governos. É uma mudança de orientação muito de longo prazo e que precisa de desenvolvimento. Isso que é muito importante. Não adianta só a intenção, a vontade de construir habitações melhores, ter planos urbanísticos democráticos e participativos. É preciso desenvolver o país, retomar de maneira sustentável o desenvolvimento, equilibrar melhor no território nacional o desenvolvimento econômico, ter um desenvolvimento econômico de um novo tipo. É um conjunto de ações que fariam no médio e no longo prazo reverter ou, pelo menos, uma tendência muito forte de reverter esse tratamento policialesco da questão social. Caso contrário, isso vai continuar sempre assim. Um município até pode ter uma política muito desenvolvimentista, pode fazer muito, construir equipamentos, melhorar significativamente seu espaço mas, na sua fronteira, estão legiões de pessoas que serão até atraídas por essas melhorias, pelo aumento de oportunidades. Em último caso, se não houver ações mais abrangentes para reverter essa situação, isso vai fazer com que as próprias melhorias verificadas em um município isolado se revertam por conta da pressão externa que lhe é desfavorável.
Brasil de Fato - Em que outras cidades também se verifica essa tendência de valorização de alguns espaços (inclusive de áreas centrais) e, em contrapartida, de remoção de populações pobres para as periferias?
Ricardo Gaspar - As cidades apresentam aspectos dos mais diferenciados. Hoje o fenômeno da pobreza e da expansão periférica está em cidades do Primeiro Mundo que antes não viviam fenômenos dessa natureza, pelo menos com tamanha gravidade. Qualquer cidade hoje da Europa, grandes cidades como Paris e Roma têm localidades que são verdadeiros guetos, com difícil entrada até da própria polícia. A suburbanização nas cidades norteamericanas seguiu um efeito diverso, mas é um problema seríssimo lá também. A suburbanização dos Estados Unidos levou para a periferia os segmentos de alta renda, extratos sociais dos mais "endinheirados" é que foram morar mais distante, aí surgiram condomínios, shopping centers, cidades muradas e assim por diante. Mas em quase todas as grandes cidades do planeta, principalmente nos países em desenvolvimento, esse fenômeno é hoje avassalador. Tem até um livro, com o qual até não concordo talvez no tom, mas a tese é inegável, de um famoso investigador chamado Mike Davis, "Planeta Favela", ("Planet of Slums"), onde ele mostra, com muitos dados e evidência, que as favelas têm se tornado a característica mais importante da expansão urbana, que é reconhecida por todos os organismos internacionais. Hoje a maioria da população do mundo é urbana, e a favelização tem sido a característica principal, infelizmente, dessa expansão. Em suma, o que o próprio Mike Davis diz, as pessoas acorrem hoje às grandes cidades não mais em busca do sonho, do eldorado do emprego, mas para buscar abrigo contra a miséria.

Brasil de Fato - Qual deve ser o futuro de São Paulo se continuar neste ritmo de ocupação e crescimento?
Ricardo Gaspar -Como eu disse, apesar dessa visão que privilegiou um aspecto mais pessimista, eu sou otimista, mas não de um otimismo ingênuo. Nós temos uma cidade como São Paulo, por exemplo, que tem um dinamismo impressionante. Problemas ficaram, com a fuga de indústrias e a decadência nos anos 80, depois a recessão econômica, mas na realidade São Paulo se reciclou e hoje continua sendo, até de uma maneira renovada, um centro econômico de primeiríssima grandeza. Perdeu alguns setores, alguns ramos industriais, ganhou outros, mas ela tem uma centralidade muito provavelmente mais reforçada até do que já teve em outros momentos históricos, na medida em que hoje a centralidade não é apenas industrial, mas comercial, financeira, cultural e até política. Então eu acredito que a humanidade, a sociedade brasileira e a pressão das forças sociais deve ser suficiente pelo menos para afastar as tendências mais perniciosas e construir uma cidade mais justa. Acho que há muitas evidências nesse sentido, as próprias populações ditas periféricas, que vivem em habitações subnormais, favelas etc dão mostras de uma excepcional vitalidade. Se há governos que muitas vezes não favorecem essas tendências, por sua vez essas tendências são renovadas em futuros governos, de caráter mais democrático, tanto no ponto de vista municipal quanto estadual, federal e até global. Há uma tendência muito forte no sentido de renovação urbana e melhoria ambiental e isso, acredito eu, tem boas chances de prevalecer. Haverá eleições no ano que vem, depois outras eleições no próximo ano, e esses são sempre momentos importantes de se debater não apenas o problema de São Paulo, de Santo André, de Osasco, de São Bernardo, de Diadema, mas o problema metropolitano em geral, porque os problemas estão interligados. Um se vincula ao outro, então é importante que a gente comece a preencher essa lacuna terrível que não foi preenchida por nenhum dos últimos governos estaduais e comecemos a pensar os nossos problemas de forma mais coletiva, mais agregada e mais solidária.

domingo, 22 de novembro de 2009

‘Poder de veto’ da indústria de biotecnologia para pesquisas sobre efeitos dos transgênicos


Cientistas denunciam perseguição e "poder de veto" da indústria de biotecnologia para pesquisas sobre efeitos dos transgênicos Finalmente os pesquisadores (norteamericanos, ao menos) estão começando a denunciar as pressões e ameaças que sofrem quando ousam desafiar a indústria de biotecnologia ao desenvolver e publicar pesquisas que analisem os efeitos dos transgênicos para a saúde ou o meio ambiente.
Já havíamos divulgado no Boletim 452 o editorial publicado pela revista Scientific American em agosto deste ano, relatando como as empresas conseguem se valer das leis de propriedade intelectual para obter controle absoluto sobre o que pode e o que não pode ser publicado em relação às suas sementes. Agora foi a vez da revista científica Nature Biotechnology publicar um artigo (outubro de 2009) denunciando o mesmo problema. Segundo o artigo, "não é segredo que a indústria de sementes tem o poder de moldar as informações disponíveis sobre lavouras transgênicas. Foram empresas privadas que desenvolveram praticamente todas as sementes que estão no mercado norteamericano, e os direitos de propriedade intelectual sobre a tecnologia permite que elas decidam quem vai estudar as lavouras e como."
O controle das empresas começa com um simples contrato para produtores. Qualquer pessoa que queira comprar sementes transgênicas precisa assinar um contrato de tecnologia que diz, entre muitas outras coisas, que o comprador não pode conduzir pesquisas com as sementes, e nem dá-las a outrem para a realização de pesquisas. Para fazer pesquisas, os cientistas precisam pedir permissão às empresas, especificando o que pretendem fazer com as plantas -- ou correm o risco de ser processados.
As empresas de sementes podem negar os pedidos com base em qualquer razão -- e, conforme ilustra o artigo, algumas vezes elas são bem criativas. Outras vezes, são simplórias: em um caso relatado, a Pioneer Hi-Bred disse a um pesquisador que "não dispunha de material apropriado para fornecer". Quando a empresa e os pesquisadores conseguem concordar em um projeto de pesquisa, eles precisam negociar os termos do acordo.
Segundo pesquisadores, muitos destes acordos costumam travar quando as empresas querem controlar ou bloquear a publicação da pesquisa. Também são impressionantes os relatos de manipulação de dados praticados pelas empresas. Um caso descrito no artigo foi de um milho da Pioneer tóxico a insetos. Em 2001 a empresa contratou alguns laboratórios de universidades para estudar efeitos indesejados do milho em uma espécie de joaninha.
Os laboratórios descobriram que quase 100% das joaninhas que foram alimentadas com o milho morreram no oitavo dia do ciclo de vida. Quando os pesquisadores apresentaram seus resultados à Pioneer, a empresa os proibiu de divulgar os dados. Como a variedade de milho ainda não era comercializada, o acordo de pesquisa dava à Pioneer o direito de vetar a publicação dos resultados. Dois anos depois a Pioneer recebeu autorização para comercializar um milho que continha exatamente a mesma toxina daquele usado nos experimentos com as joaninhas. Mas os dados submetidos ao EPA (Agência de Proteção Ambiental do governo americano, na sigla em inglês) não informavam os efeitos sobre as joaninhas -- apesar de a empresa ter seguido os protocolos normais de pesquisa.
Num dos estudos da Pioneer, a empresa forneceu a toxina purificada às joaninhas até o sétimo dia de vida -- um dia antes do que havia sido observado como o estágio mais suscetível. Em um segundo estudo, a empresa acompanhou as joaninhas até o final do ciclo de vida, mas usou um modo diferente de alimentação, fornecendo um pó homogeneizado contendo metade presas (pequenos animais dos quais elas se alimentam, como insetos e ácaros) e metade pólen, e não verificou nenhum efeito. Segundo um dos pesquisadores envolvidos com a primeira pesquisa, a EPA foi informada da pesquisa independente, mas preferiu não agir. E a Pioneer não daria permissão aos cientistas para refazer o experimento.
Também sobre este tema, um outro artigo [1] publicado pela renomada revista científica Nature em setembro deste ano apresentou em detalhes a saga que atravessam os cientistas que se arriscam a publicar pesquisas indicativas de efeitos maléficos dos transgênicos. O caso apresentado em maior detalhe é o das pesquisadoras Emma Rosi-Marshall e Jennifer Tank, que em 2007 publicaram um estudo indicando que as larvas de um inseto herbívoro da ordem trichoptera que vivem em pequenos cursos d’água no norte de Indiana (EUA), onde as lavouras de milho Bt (tóxico a insetos) se espalham até onde alcança a vista, também são afetadas pelo Bt. No artigo, publicado na revista científica PNAS (Proceedings of the National Academy of Sciences), as autoras concluem que o plantio disseminado de lavouras Bt provoca consequências inesperadas em escala de ecossistemas. A reação furiosa de cientistas pró-transgênicos foi imediata.
Em apenas duas semanas, diversos pesquisadores já haviam escrito para as autoras, para a revista PNAS e para a Fundação Nacional de Ciência (NSF, em inglês) do governo americano, que financiava o trabalho de Rosi-Marshall. O trabalho foi acusado de falho, omisso, mal desenhado, entre outras coisas. Um dado interessante apontado por Arthur Benke, um dos cientistas que prestaram apoio às autoras afirmando o valor dos dados publicados, é que absolutamente nenhuma das críticas sugere o aprofundamento das pesquisas sobre o caso.
"O que relatórios como este fazem é nos alertar sobre possíveis razões para analisarmos a questão com mais cuidado", diz ele. Allison Power, pesquisadora de ecologia e biologia evolutiva da Cornell University, complementa: "Tentar desmentir a pesquisa imediatamente é um ato que ignora como a ciência deve funcionar: você formula uma hipótese, testa-a, refina-a, testa-a e refina-a novamente. Você segue fazendo isso até conseguir uma resposta que seja tão próxima quanto possível da que se pode obter. Não entendo que exista resistência a esta noção".
Embora o artigo da Nature conceda muito espaço para os cientistas pró-transgênicos exporem seus argumentos e pontos de vista, a sua leitura deixa evidente o caráter preconceituoso e grosseiro dos supostos críticos. Um destes "críticos" relata que formou uma "equipe de refutação" chamado "ask-force" (algo como "força tarefa para questionamentos") para desafiar pesquisas sobre a biossegurança de lavouras transgênicas. Das 20 pesquisas já "criticadas" pelo grupo, nenhuma é positiva em relação aos efeitos dos transgênicos". O principal argumento dos detratores das pesquisas é que elas podem ser usadas por ativistas anti-transgênicos para fomentar ações e influenciar as políticas sobre o tema. Com base nisso, promovem todo o tipo de perseguição. Ignacio Chapela, um pesquisador da Universidade da Califórnia, em Berkeley, conta que estes ataques estão dissuadindo jovens cientistas a seguir carreiras em pesquisa sobre lavouras transgênicas. "Já tenho uma longa experiência com pessoas jovens que me dizem que não vão para este campo precisamente por serem desencorajados pelo que vêem", diz ele.
Para quem não se lembra, Chapela foi um dos primeiros cientistas a enfrentar este tipo de perseguição. Em 2001 ele publicou um artigo na mesma Nature relatando que variedades crioulas de milho no México estavam contaminadas por genes transgênicos. A reação negativa foi tão forte que, de maneira inédita, a Nature publicou uma nota reconhecendo que "as evidências disponíveis [no estudo de Chapela] não eram suficientes para justificar a publicação da pesquisa". Posteriormente, análises feitas pelo governo mexicano confirmaram a contaminação apontada por Chapela.
É muito importante que estas denúncias comecem a circular em publicações científicas respeitadas. Vamos esperar que estes artigos incentivem outros cientistas intimidados a sair do casulo. Especialmente por aqui: já passou da hora de os nossos pesquisadores começarem também a se indignar e se articularem para desmascarar a defesa pseudocientífica dos transgênicos no Brasil e tentar conter e reverter as atrocidades cometidas pela CTNBio "em nome da ciência".
Nota:
[1] Battlefield - Papers suggesting that biotech crops might harm the environment attract a hail of abuse from other scientists. NatureVol 4613 September 2009.Artigo disponível em inglês mediante
pagamento:http://www.nature.com/news/2009/090902/full/461027a.html
[POR UM BRASIL LIVRE DE TRANSGÊNICOS. Número 468 - 20 de novembro de 2009]
* Da Campanha Por Um Brasil Livre de Transgênicos e Agrotóxicos