quarta-feira, 28 de outubro de 2009

GESTAÇAO E NASCIMENTO DO MST ( 1979 -1985)

Por Bernardo Mançano Fernandes
A natureza e a formação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
O MST é fruto do processo histórico de resistência do campesinato brasileiro. Nesse processo, os fatores econômicos e políticos são fundamentais para a compreensão da natureza do MST. Na década de 1970, os governos militares implanta­ram um modelo econômico de desenvolvimento agropecuário que visava acelerar a modernização da agricultura com base na grande propriedade, principalmente pela criação de um sistema de créditos e subsídios. Esse sistema financiou a modernização tecnológica para alguns setores da agricultura, de forma que esta passou a depender menos dos recursos naturais e cada vez mais da indústria produtora de insumos. Esse modelo causou profundas transformações no campo. De um lado, aumentou as áreas de cultivo da monocultura da soja, da cana-de-açúcar, da laranja entre outras; intensificou a mecanização da agricultura e aumentou o número de trabalhadores assalariados. De outro lado, agravou ainda mais a situação de toda a agricultura familiar: pequenos proprietários, meeiros, rendeiros, parceiros etc., que continuaram excluídos da políti­ca agrícola. Essa política que ficou conhecida como modernização conservadora promoveu o crescimento econômico da agricultura, ao mesmo tempo que concentrou ainda mais a propriedade da terra, expropriando e expulsando mais de 30 milhões de pessoas que migraram para as cidades e para outras regiões brasileiras.
Mesmo com a repressão às formas de organização camponesas pelo regime mili­tar, a luta pela terra continuou em todo o território nacional. Um fator essencial que contribuiu para o desenvolvimento e crescimento da luta foi a participação da Igreja Católica, por meio da Comissão Pastoral da Terra. A CPT foi a articuladora das dife­rentes experiências que construíram uma nova realidade no campo. Durante o regime militar, as Comunidades Eclesiais de Base foram os espaços de socialização política que permitiram a recriação da organização camponesa. A Igreja Católica vinha pas­sando por profundas mudanças e era cada vez maior o envolvimento de religiosos com a realidade dos trabalhadores. Essa postura era resultado de decisões tomadas na Igreja após o Concílio Vaticano II (1965), e posteriormente na II Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano em Medellín, Colômbia (1968), e na III Conferên­cia em Puebla, México (1979). Por meio desse movimento de renovação da Igreja pela Teologia da Libertação, as Comunidades Eclesiais de Base tomaram-se espaços de re­flexão e aprendizado de como transformar a realidade, por intermédio da luta pela terra, recusando a condição imposta pela política da modernização conservadora.
A gênese do MST aconteceu no interior dessas lutas de resistência dos trabalha­dores contra a expropriação, a expulsão e o trabalho assalariado. O Movimento come­çou a ser formado no Centro-Sul, desde 7 de setembro de 1979, quando aconteceu a ocupação da gleba Macali, em Ronda Alta no Rio Grande do Sul. Essa foi uma das ações que resultaram na gestação do MST. Muitas outras ações dos trabalhadores sem-terra, que aconteceram nos Estados de Santa Catarina, Paraná, São Paulo e Mato Grosso do Sul, fazem parte da gênese e contribuíram para a formação do Movimento. Assim, a sua gênese não pode ser compreendida por um momento ou por uma ação, mas por um conjunto de momentos e um conjunto de ações que duraram um período de pelo menos quatro anos.
De 1979 a 1984 aconteceu o processo de gestação do MST. Chamamos de gesta­ção o movimento iniciado desde a gênese, que reuniu e articulou as primeiras expe­riências de ocupações de terra, bem como as reuniões e os encontros que proporcio­naram, em 1984, o nascimento do MST ao ser fundado oficialmente pelos trabalhado­res em seu Primeiro Encontro Nacional, realizado nos dias 21 a 24 de janeiro, em Cascavel, no Estado do Paraná. Em 1985, de 29 a 31 de janeiro, os sem-terra realiza­ram o Primeiro Congresso, principiando o processo de territorialização do MST pelo Brasil. Portanto, neste capítulo analisamos algumas das experiências construídas no período 1979-1985 nos estados onde se desenvolveram as lutas que geraram o MST.

A luta dos colonos de Nonoai
Os lugares e os momentos formam a realidade. As pessoas fazem os momentos, transformam os lugares e constroem a realidade. Foi assim que trabalhadores sem-terra de vários estados começaram a formar o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. A expropriação, a expulsão das famílias camponesas e a usurpação do território indígena geraram uma das condições que levaram à luta os camponeses que iriam realizar a ocupação de terra, que também inaugurou o processo de formação do MST, na região noroeste rio-grandense.
Maio de 1978 é um marco histórico dessa luta. Foi quando os índios Kaigang da Reserva Indígena de Nonoai, que vinham lutando desde 1974 com o apoio do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), iniciaram as ações para recuperar seu território e resolveram expulsar as 1.800 famílias de colonos-rendeiros que viviam naquelas ter­ras. A Reserva Indígena de Nonoai foi criada em 1847 e a entrada na área das primei­ras famílias sem-terra começou na década de 1940, sendo que em 1962 já existiam 400 famílias que arrendavam lotes de até 20 ha. Em 1963, em tomo de 5.000 famílias do MASTER que estavam acampadas na fazenda Sarandi, e em outros acampamen­tos da região, foram despejadas. Para parte das famílias que resistiram, o governo es­tadual ofereceu a condição de se tomarem rendeiros do Serviço de Proteção ao Índio (SPI), ocupando as terras da área indígena. Somente 15 anos depois, com a sua orga­nização, os Kaigang, cessaram essa relação de exploração.
Em maio de 78, em menos de um mês, os Kaigang expulsaram os colonos. Para esses trabalhadores restavam três alternativas: 1) migrar para os projetos de coloniza­ção da Amazônia; 2) tomar-se assalariados de empresas agropecuárias ou de indústri­as, migrando para as cidades, e 3) lutar pela terra no Estado do Rio Grande do Sul.
Esta última alternativa era a aspiração da maior parte dos colonos sem-terra. A questão é que não existia nenhuma forma de organização social de que pudessem se valer para realizarem os seus intentos. Dessa forma, ocorreu a dispersão da maior parte das famílias que passaram a vagar pelos municípios do noroeste rio-grandense. Algumas acamparam nas beiras das estradas, outras foram morar em paióis, porões e casas de parentes e camaradas, outras passaram mesmo a viver em chiqueiros junto com os animais, e, ainda, muitas famílias perambulavam pela região sem terem onde ficar. Todavia, como já disse o poeta, por mais que se queira transformar em nada, saibam que a história é como a madrugada. quem acorda cedo faz o amanhecer (Bogo, s.d.), de modo que, menos de dois meses depois de terem saído da Reserva indígena de No­noai, os colonos sem-terra começaram as primeiras ocupações.
Era junho de 1978, alguns grupos de famílias isolados e sem uma forma de organização definida entraram nas Glebas Macali e Brilhante, em Ronda Alta, e na Reser­va Florestal da fazenda Sarandi, em Rondinha. As glebas eram terras públicas que es­tavam arrendadas para empresas. As ocupações começaram com 30 famílias e chega­ram a quase 300. Essa ação tem um importante significado histórico, porque a luta re­começava exatamente onde havia sido interrompida em 1963. Frente ao fato, o Go­verno do Estado enviou o secretário da agricultura para cadastrar estas famílias, pro­metendo assentá-Ias "quando fosse feita a reforma agrária". Com esse ato, os colonos foram convencidos a retomarem para as casas de amigos e familiares, onde estavam abrigados. Desse modo, se por um lado o governo tentou se livrar do problema, por outro lado, surgiram muitas outras famílias querendo se cadastrar, com a esperança de serem assentados no Rio Grande do Sul.
Outra parte das famílias de Nonoai foi transferida para o Parque de Exposições de Esteio, próximo a Porto Alegre. O governo estadual propôs assentar uma parte em Bagé, ao sul do estado. O governo federal propunha assentá-Ias em Mato Grosso, em um projeto de colonização denominado Terranova. Para Bagé foram 128 famílias e para Terranova foram 550 famílias.

O Povo de Deus
Nesse entretanto, na Paróquia de Ronda Alta, chegaram 5 famílias, em torno de 50 pessoas, e pediram pousada ao pároco, padre Arnildo, que trabalhava na Comissão Pastoral da Terra e, por meio da Bíblia, procurava conscientizar os colonos expulsos. Os sem-terra argumentavam que já haviam buscado apoio em várias paróquias de municípios da região, nos sindicatos, nas prefeituras e a resposta que obtiveram foi que o problema era do governo. Padre Arnildo ofereceu abrigo na casa paroquial. À noite, fizeram uma reflexão sobre o capítulo terceiro do livro do Êxodo, que relata o sofrimento e a libertação do Povo de Deus em busca da terra prometida. As pessoas disseram que aquela também era a sua história e o padre Arnildo perguntou, então, o que eles pretendiam fazer. As famílias decidiram participar dos diversos acampamen­tos que existiam na região. Por meio dessa reflexão, ficara entendido que a solução te­ria que partir da ação e da organização dos próprios trabalhadores. Essa era a única forma de mudarem as suas realidades. Cada família tinha um trabalho a realizar: de­veria discutir com as outras famílias acampadas qual seria a saída, e voltar um mem­bro de cada família para se reunirem e decidirem o que fazer. Quinze dias depois, en­contraram-se na casa paroquial e resolveram realizar assembléias nos acampamentos para construírem uma forma de organização e lutarem pelos seus direitos.
Até esse momento, frente aos limites das três experiências: a ocupação e o cadastramento, o assentamento em Bagé e a migração para o Mato Grosso, os trabalhado­res resolveram criar uma forma de organização para fazer avançar a luta. Em julho de 1979, depois de um intenso trabalho de base, em torno de 1.100 famílias reuniram-se no salão do Centro de Tradição Gaúcha de Nonoai, onde os colonos realizaram uma assembléia para decidirem sobre os seus destinos: lutar pela terra no estado ou migrar para o Mato Grosso. Deliberaram que as soluções para os seus problemas deveriam ser a1cançadas em comum e não de forma individualizada. Tomaram mais duas deci­sões: fazer um abaixo-assinado ao governador, reivindicando o assentamento no esta­do e, senão fossem atendidos, ocupariam a fazenda Sarandi novamente. Assim, ger­minava a organização dos colonos e se solidificava pela sua própria legitimação.
No dia primeiro de agosto de 1979, os colonos conseguiram uma audiência com o governador e reivindicaram o assentamento nas Glebas Macali e Brilhante. O gover­nador pediu trinta dias de prazo para dar uma resposta. Foi quando um colono pergun­tou o que o governo faria, se eles ocupassem a terra. Numa atitude demagógica, o go­vernador respondeu que iria junto para a ocupação. No dia primeiro de setembro, ven­ceu o prazo de trinta dias, e o governo não deu nenhuma resposta. Os colonos se reu­niram e discutiram a situação. Chegaram ao acordo que o governo não iria resolver o problema deles e que o único jeito seria a ocupação da terra.

A ocupação como forma de luta
Resolveram realizar a ocupação na noite do dia 6 e madrugada do dia 7 de setembro. A data escolhida possibilitava um maior tempo para organizar a ocupação e a resistência. As lideranças dos acampamentos espalhados pela região iniciaram os traba­lhos de mobilização e na noite do dia 6, os caminhões transportando 110 famílias de colonos sem-terra entraram pela Gleba Brilhante e acamparam na Gleba Macali. Era a madrugada do dia 7 de setembro de 1979, a lua cheia clareava o caminho da terra prometida e em pouco tempo a Macali era terra ocupada. Haviam decidido nas reu­niões que assim que entrassem na terra fincariam uma cruz, que significa tanto o so­frimento quanto a conquista. E na cruz colocaram a bandeira do Brasil, porque era o dia da pátria e porque lutavam para serem cidadãos.
Na tarde do dia 7 realizaram a primeira celebração. Recordaram a caminhada, passo a passo, como quem reconstrói a própria história, leram os versículos do livro do Êxodo, que descrevia a caminhada do Povo de Deus em busca da terra prometida. no dia 8, chegou a Brigada Militar e montou acampamento próximo à área e no dia 9 reforçaram o pelotão com um número maior de soldados. O acampamento dos colo­nos era um espaço de luta e de resistência, de modo que estavam dispostos ao enfren­tamento. As mulheres pegaram seus filhos e formaram uma barreira em torno do acampamento. Esse enfrentamento fez os brigadianos recuarem de suas posições e começaram as negociações com o governador. Algumas lideranças foram cobrar do governador se ele iria ou não ocupar também aquela terra. Levaram como prova um recorte de jornal, em que havia a declaração que ele tinha feito há 40 dias atrás. O go­verno autorizou os colonos a plantarem na área e retirou a Brigada Militar do local. Iniciava a primeira experiência de organização do trabalho e da produção na terra conquistada. A conquista da Macali fortalecia a decisão dos colonos de serem assen­tados no próprio estado.
Nesse entretanto, começou a formação de um novo grupo de famílias para realizarem nova ação. No dia 25 de setembro, cento e setenta famílias ocuparam a Brilhante. A terra estava arrendada e cultivada com soja e milho. A repressão policial foi mais intensa, mas a luta pela terra ganhava o apoio da sociedade, de modo que o go­verno não se atreveu a usar de violência. Também um grupo de oitenta famílias, mo­bilizadas por vereadores do Partido Democrático Social (PDS), ocuparam outra par­te da gleba Brilhante e formaram o acampamento 2. Essa ocupação era uma reação isolada dos políticos locais, que "defendiam" o assentamento de filhos de agriculto­res dos municípios de Sarandi, Ronda Alta e Rondinha. Essa atitude oportunista tinha como objetivo se aproveitar das ações iniciadas pelos colonos de Nonoai. Todavia, essas famílias foram abandonadas pelos vereadores, muitas desistiram e outras per­sistiram juntando-se aos colonos.
No desenrolar das negociações, que não se concluíam, novamente as mulheres partiram para o enfrentamento. Na época da colheita, fizeram um cordão de isola­ mento em tomo das máquinas, impedindo o trabalho dos empregados do arrendatá­rio. Essa ação resultou na resolução parcial da questão, as famílias foram assentadas e também colheram parte do milho e da soja. Contudo, como havia aumentado o núme­ro de acampados, a área não era suficiente para assentar todas as famílias. Depois das conquistas das Glebas Brilhante e Macali, as famílias remanescentes ocuparam a Fa­zenda Anoni, em outubro de 1980. A Polícia Federal interveio imediatamente, reali­zou o despejo e prendeu doze trabalhadores, desmobilizando o grupo de famílias. Embora essa ocupação tivesse sido derrotada, ela reforçava a luta que originaria a conquista da Anoni, na segunda metade da década de 1980. Outra ocupação também havia sido frustrada. Ela aconteceria em Campinas do Sul, próximo à Barragem de Passo Fundo. Todavia, a Brigada Militar foi informada do planejamento da ação e en­trou na área antes que os sem-terra chegassem.
No dia 4 de novembro de 1980, um grupo de sem-terra acampou no centro de Porto Alegre para reivindicar do governo estadual o assentamento das famílias rema­nescentes. Depois de duas semanas de negociações, os colonos conseguiram um acordo com o governo, que cedeu uma área do Estado, de 240 ha, no município de Rondinha, e comprou uma área de 1.049 ha, no município de Palmeira das Missões, para assentar parte das famílias. Todavia, ainda ficaram famílias acampadas. Dessa forma, os trabalhadores sem-terra retomavam as suas forças, inaugurando um novo movimento social que germinava em vários lugares do Brasil.

As encruzilhadas da história
A encruzilhada é o lugar onde se cruzam os caminhos. A luta que nasceu com o acampamento na Encruzilhada Natalino se opunha à política fundiária do governo. Era, também, um conflito entre o modelo econômico agropecuário implantado pelos militares, com a política de desenvolvimento para a agropecuária que os camponeses vêm construindo por meio de suas lutas. Aquela ação representava, igualmente, o momento e o lugar do cruzamento de dois projetos políticos para o campo brasileiro. Essa forma de luta significa a recusa dos camponeses à modernização conservadora. Essa política do governo privilegia o grande capital e tem conduzido os camponeses à expropriação, à expulsão da terra, à exclusão, à miséria e à fome. A política dos traba­lhadores leva à resistência na conquista da terra e do trabalho, da dignidade, da cida­dania, com a ressocialização dos camponeses sem-terra. Esse conflito tem um caráter histórico, porque a encruzilhada se tomaria o espaço político em que se encontram os sem-terra e os governos estadual e federal. E neste cruzamento de políticas opostas, buscam soluções para os conflitos fundiários, desde a desapropriação da terra até as políticas de desenvolvimento da agricultura camponesa, como por exemplo: o crédito agrícola, a educação, o cooperativismo etc. Todavia, ambos continuam seguindo ca­minhos políticos distintos. E neste sentido, a luta pela terra toma-se uma ação funda­mental para fazer crescer a luta pela reforma agrária.
Na luta pela terra, a encruzilhada também tem o sentido do cruzamento dos caminhos construídos durante a resistência. Cruzam-se os caminhos da vitória e da derro­ta. A encruzilhada é o lugar e o momento da tomada de decisão para qual direção deve se seguir, com o objetivo de conquistar a terra. É, portanto, um lugar onde se pára, re­flete e olha, procurando visualizar qual o melhor caminho a percorrer. E muitas ve­zes, se o caminho ainda não existe, é preciso fazê-lo. Foi assim que aconteceu na En­cruzilhada Natalino, ali também foi o ponto de partida para a construção do caminho da luta pela terra. Montar o acampamento foi uma decisão tomada na encruzilhada da luta. E na encruzilhada são muitos os caminhos possíveis. Desde os existentes até os que estão por construir, porque abrir caminhos na realidade é fazer história. Foi assim que esta luta tomou-se uma das principais referências da História do MST.




O acampamento Encruzilhada Natalino

Na luta pela terra, acampar é determinar um lugar e um momento transitório para transformar a realidade. Quando os sem-terra tomam a decisão de acampar, estão desafiando o modelo político que os exclui da condição de cidadãos. A resistência no acampamento é a façanha. A persistência é o desafio. Para sobreviver, os acampados depen­dem de sua organização, do trabalho e do apoio dos que defendem a reforma agrária. O acampamento da Encruzilhada Natalino era resultado das experiências das lutas anteriores. Começou quando um colono, expulso da Reserva Indígena de Nonoai, montou seu barraco próximo ao encontro das estradas que levam a Ronda Alta, Sarandi e Passo Fundo. Esse fato aconteceu no dia 8 de dezembro de 1980. O lugar se chama Encruzi­lhada Natalino, porque havia uma casa comercial, cujo proprietário chamava-se Natá­lio. O primeiro colono que acampou também se chamava Natálio. Foi seguido de outras famílias de Nonoai e de famílias remanescentes da ocupação da Gleba Brilhante. Da mesma forma, vieram outros camponeses sem-terra de toda a região. Eram rendeiros, parceiros, agregados, peões, assalariados e filhos de pequenos proprietários.
Na tentativa de desmobilizar o acampamento, o governo estadual mandou uma comissão oferecer empregos aos sem-terra. Acompanhada do bispo de Passo Fundo, D. Cláudio Colling, os representantes do governo procuraram convencer os acampa­dos. Frente à recusa incondicional das famílias, a comissão e o bispo desistiram do in­tento. Superando desafios, persistia o processo de gestação do acampamento, que era resultado da consciência construída pelos camponeses, de que somente por meio da luta mudariam suas realidades, e também pela articulação feita pela CPT e pelo Mo­vimento de Justiça e Direitos Humanos, que ajudavam na organização dos sem-terra. Começaram a fazer o levantamento dos latifúndios nos municípios próximos, classi­ficados pelo Incra como latifúndios por exploração, provando ao governo que a ques­tão poderia ser resolvida na própria região. A Igreja Evangélica de Confissão Luterana fez um levantamento e mostrou que, próximo ao acampamento, havia 4.000 ha de terras à venda, contrariando os argumentos do governo que continuava afirmando não haver terras disponíveis no Rio Grande do Sul e, portanto, era necessário transfe­rir as famílias para outros estados do Norte e Nordeste.
O acampamento localizava-se num lugar estratégico, porque ficava próximo da Anoni, bem como da Macali e da Brilhante. Em abril de 1981, havia 50 famílias acampadas. Em junho havia 600 famílias, reunindo mais de 3 mil pessoas que habita­vam em barracos de lona, de capim, de madeira, de sacos de cimento ou adubo. Os barracos estendiam-se por quase dois quilômetros da estrada. Com base nas experiên­cias anteriores, as famílias começaram a se organizar em grupos, setores e comissões. A coordenação era formada por lideranças escolhidas entre os sem-terra. Essas pesso­as mais alguns assessores formavam a Comissão Central, responsável pela direção política da luta. Era o embrião de uma forma de organização social que seria referên­cia nas novas lutas animadas pela Encruzilhada. Criaram as comissões de saúde, de alimentação, de negociação. Também criaram um boletim informativo denominado Sem Terra, que viria a se tomar o Jornal do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Com o apoio da Campanha de Solidariedade aos Agricultores Sem Terra, montaram uma secretaria em Porto Alegre. As condições do acampamento eram pre­cárias: faltavam utensílios, acomodações, agasalhos, alimentação, condições de higi­ene etc. Ainda, as famílias viviam sobre pressão do governo que não oferecia uma so­lução concreta voltada para as reivindicações dos trabalhadores. Sofriam intimida­ções da Brigada Militar que sobrevoava o acampamento constantemente, na tentativa de desanimar os camponeses para que desistissem da resistência.

A intervenção militar-federal na Encruzilhada Natalino
A luta pela terra ensina. Cada família da luta tem uma história rica em acontecimentos que marcam para toda a vida. Não há como esquecer, tanto pelo sofrimento na caminhada, quanto pela alegria da chegada, na conquista da terra. Nesse sentido, Natalino foi uma escola. Muitas das ações de resistência construídas nessa luta foram referências principais na troca de experiências com outras lutas que aconteciam em todo o Brasil. Foi um exemplo de luta e resistência que animou os trabalhadores. Como símbolo de resistência, os sem-terra fizeram uma cruz rústica. Começaram a receber apoio e contribuições de sindicatos de várias categorias de trabalhadores, de comunidades de diversas paróquias, de alguns prefeitos, de agricultores e de estudan­tes. De modo que na festa da Páscoa comemoraram a caminhada e colocaram escoras na cruz, que tinham os nomes das entidades que auxiliavam na luta. No princípio, a cruz era fincada na terra. Depois, com as ajudas que receberam, a cruz passou a ser sustentada pelas escoras que simbolizavam os apoios. Assim, sempre que havia uma manifestação, a cruz era transportada e era mantida em pé pelas escoras. Durante o período do acampamento morreram cinco crianças e as famílias colocaram cinco fai­xas brancas, representando as suas presenças na luta pela terra. No dia 21 de junho foi realizada uma missa com o bispo D. Pedro Casaldáliga, de São Félix do Araguaia (MT), que veio trazer sua solidariedade aos acampados. A ce­lebração reuniu 6 mil pessoas e a luta ganhava conotação nacional, sendo divulgada em quase todo o Brasil. Com o crescimento da organização, o governo federal apre­sentou uma proposta, que foi recusada pelos sem-terra, de transferir as famílias para projetos de colonização em Roraima, Acre, Mato Grosso e Bahia. No dia dos traba­lhadores rurais (25 de julho) fizeram uma grande comemoração com mais de 10 mil pessoas e que teve a participação de D. Tomás Balduíno, bispo de Goiás Velho (GO), que denunciou a miséria em que viviam os colonos que haviam se deslocado para o Projeto de Colonização em Canarana (MT). O bispo defendia a resistência e o assen­tamento das famílias no estado. D. Tomás prenunciou o significado histórico daquela luta, ao afirmar que ela representava para o campo o que as greves do ABC significa­ram para a organização dos trabalhadores da cidade. O governo temia que neste dia fosse feita uma grande ocupação na Fazenda Anoni. Por essa razão, mandou a Briga­da Militar cercar a Anoni.
Como o governo sempre apresentava a mesma proposta, os acampados decidi­ram, em assembléia, que acampariam na frente do Palácio do Governo, na Praça da Matriz, em Porto Alegre para o pressionar. Quatro ônibus saíram em direção à capi­tal. Encontraram várias baneiras pelo caminho. Em Sarandi foram barrados pela Bri­gada Militar. Chegando em Porto Alegre, enfrentaram outro batalhão da Brigada com mais de cem brigadianos e vinte viaturas que fizeram os ônibus desviarem da rota. Os sem-terra resolveram seguir a pé até o local da manifestação. Com o apoio da CPT, da Comissão de Direitos Humanos e de dois deputados, conseguiram uma audiência com o governador, que reproduziu a mesma proposta. Se os trabalhadores não viam perspectivas junto ao governo estadual, a situação era pior com relação ao governo federal. Logo depois da reunião com o governador, a comissão de negociação rece­beu a informação que o Exército iria invadir o acampamento e quem estava fora não entrava, e quem estava dentro não saía. Os sem-terra voltaram rapidamente para a En­cruzilhada e chegaram um pouco antes do Exército. Com a intervenção, o acampa­mento foi declarado Área de Segurança Nacional.
A espionagem no acampamento vinha sendo praticada pelos militares há algum tempo. Diversas vezes os sem-terra expulsaram suspeitos do acampamento, que eram infiltrados da Polícia e do Exército. De modo que estes já possuíam muitas informa­ções a respeito da situação dos colonos. No dia 30 de julho de 1981, o acampamento sofreu intervenção militar federal, com a presença do Exército, da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Estadual. O comando da intervenção estava a cargo do major Curió, especialista em desmobilizar ações de resistência popular e garantia que em 15 dias ele resolveria aquele caso. Ele já havia atuado em áreas de conflitos nas Regiões Norte e Nordeste. O cerco ao acampamento consistia no fechamento de todas as entradas. Os interventores alugaram um pavilhão em uma fazenda vizinha ao acam­pamento, montaram uma barraca na entrada principal e colocaram alto-falantes em torno do acampamento. Proibiram a entrada de religiosos e de todas as pessoas que apoiavam a luta. Atendendo à pressão dos acampados, que exigiam o direito de entra­rem e saírem do acampamento, implantaram um sistema de controle por meio de fi­chas, que registrava a movimentação dos sem-terra. Nem para celebrar a missa, os pa­dres podiam entrar.
Neste estado de isolamento, os interventores começaram a perseguir os colonos. As pessoas que já haviam trabalhado na cidade, com carteira registrada, eram consi­deradas sem vocação para a agricultura e, portanto, não teriam direito à terra. Alertavam as famílias que tinham ido para o Mato Grosso e retomado, que também não teri­am mais direito à terra. Exigiram de todas as famílias, que trouxessem uma certidão negativa para provar que não eram proprietários de terra. Passaram a entregar alimen­tos às famílias, mas para isso faziam com que ficassem muitas horas nas filas. Con­centravam as pessoas e utilizavam uma perua com alto-falante para divulgarem notí­cias voltadas para a desmobilização das famílias: um exemplo era a repetição de uma entrevista de D. Vicente Scherer, arcebispo de Porto Alegre, afirmando que os sem-ter­ra não tinham direito de exigir o assentamento no Rio Grande e que o governo não ti­nha obrigação de atendê-Ios. Informavam que estava ali a pedido do presidente da República, João Batista Figueiredo, e Curió se envaidecia por ter sido vitorioso em 16 casos de tensão social. Ameaçava dizendo que aqueles que não aceitassem ir para os projetos de colonização não iriam mais receber alimentos. Enfim, utilizaram de todos os artifícios para desfazer o acampamento.

Em terra de quero-quero, Curió não canta
O major tornou-se conhecido entre os acampados. Havia um trabalhador que o conhecia de Serra Pelada, no Pará, e divulgava suas práticas e táticas. Também um acontecimento notável possibilitou maior conhecimento das táticas do interventor. Numa ocasião, quando um acampado tentava sintonizar uma estação de rádio, captou a freqüência na qual os interventores se comunicavam com Brasília. Desse dia em di­ante, os acampados passaram a acompanhar suas conversas e a se anteciparem às suas tentativas de cooptação, como por exemplo quando Curió chamou a imprensa para distribuir doces às crianças. Como os pais estavam informados, orientaram seus fi­lhos para aceitarem o presente, agradecerem e pedirem terra para plantar.
A missão de Curió era desmanchar o acampamento e levar as famílias para os projetos de colonização. Montou uma grande barraca onde mostrava slides e filmes acerca dos projetos de colonização no Acre, em Roraima, Mato Grosso e Bahia. Pro­pôs levar uma comissão de sem-terra para conhecer o projeto Serra do Ramalho, na Bahia. Vieram dois aviões Búfalo da Força Aérea e transportaram os colonos para a área. Chegando numa agrovila do projeto, foram recepcionados com uma churrasca­da. Contudo, quando a comitiva começou a lavar as mãos acabou a água. E não tinha mais água. De volta, a maior parte da comissão declarou que o projeto era inviável, porque o solo era muito arenoso e pela falta de água. Uma pequena parte, que Curió tentou convencer, chegou a afirmar que o lugar era bom. Na polêmica, os intervento­res conseguiram reunir 87 famílias tendentes a aceitarem a proposta do governo. Contudo, quando tomaram conhecimento da cooptação e por causa de um dossiê da CPT baiana, que informava a insustentabilidade do projeto, pouco a pouco foram de­sistindo e por fim nenhuma família aceitou ir para a Bahia.
Diante da recusa, aumentava a violência. Passaram a transitar continuamente com os caminhões, de ponta a ponta do acampamento, levantando poeira. Destruíram as fontes de água, colocando os cavalos para pisotearem, criando pavor. Depois fez outra proposta, levar as famílias para o projeto de colonização Lucas do Rio Verde, em Mato Grosso, criado exclusivamente para assentar os acampados da Encruzilha­da. Diante da pressão, os interventores conseguiram dividir o acampamento e 137 fa­mílias aceitaram partir para a área. A maior parte recusou. Além da repressão, outros fatores que levavam as famílias a aceitarem a mudança para o projeto de colonização eram a situação precária em que se encontravam e o desespero. Estes mesmos fatores também causariam o retorno da maior parte dessas famílias. Os interventores criaram outro acampamento e transferiram as famílias aceitantes. Esse acampamento foi de­nominado de Quero-Quero. No acampamento Natalino, os barracos dessas famílias fo­ram queimados, ameaçando os que não aceitaram a proposta de transferência. Impedi­ram totalmente visitas ao acampamento Natalino. Várias entidades de apoio denuncia­ram na imprensa que o acampamento fora transformado num campo de concentração. Entraram com um pedido de salvo-conduto para que uma comitiva visitasse o acampa­mento. Realizaram uma grande manifestação com a participação de 137 padres do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, de membros da Ordem dos Advogados do Brasil, de deputados federais e estaduais. Quando outros visitantes foram impedidos de entrar pe­los soldados do Exército, os acampados pegaram a cruz com as escoras e romperam a barreira militar, possibilitando a entrada. O ato marcou a reviravolta da situação e os sem-terra recobraram as esperanças. Começava, assim, a derrota dos interventores fe­derais. A resistência dos sem-terra e o apoio das entidades foram determinantes.
No dia 31 de agosto, os interventores se retiraram do acampamento Encruzilhada Natalino. Curió foi derrotado. Passaram-se 30 dias da sua chegada e a maior parte das famílias permanecia no acampamento, recusando a proposta do governo. Ao sair do acampamento, o major recebeu de presente dos colonos um cipó com 16 nós e meio, significando que depois de 16 vitórias em outras regiões do Brasil, na Encruzilhada ele perdeu. Embora vencidos, os interventores devastaram parte do acampamento. Por meio da cooptação, da ameaça, da exploração da miséria dos acampados e de ou­tros modos menos aceitáveis, eles tentaram desenraizar a luta. A vitória dos acampa­dos da Encruzilhada demarcou a história das lutas camponesas. Foi uma prova con­creta de que a resistência e a persistência eram as armas que o modelo econômico e a política dos militares não puderam vencer. O governo federal intensificou os ataques. Ameaçou prender padre Arnildo e expulsar uma freira italiana, irmã Aurélia, que também trabalhava no acampamento. O arcebispo de Porto Alegre negociou com o governo uma medida paliativa: proibiria o padre de rezar missa no acampamento e solicitaria à superiora da freira que a "convidasse" para retomar à Itália. Assim foi fe­ito, a irmã voltou ao seu país, mas padre Arnildo, mesmo proibido de rezar a missa. continuou freqüentando o acampamento e seguiu seu trabalho, realizando novas for­mas de celebração, criando uma mística popular. Os bispos do Rio Grande do Sul se reuniram em Passo Fundo e elaboraram um documento defendendo os interesses dos acampados. Propunham a compra de terras no estado para assentar as famílias acam­padas, inclusive na Fazenda Anoni.

Nova Ronda Alta: terra prometida
Com a saída dos interventores, os acampados retomaram a forma de organização de Natalino, recriando as comissões e retomando as atividades. De outubro a dezem­bro de 1981, os sem-terra procuraram o governo estadual por diversas vezes para ne­gociar o assentamento no estado. Em dezembro algumas famílias começaram a voltar de Mato Grosso, informando que o projeto Lucas do Rio Verde não oferecia condi­ções de sobrevivência e que o governo federal não cumprira com as promessas. Para divulgar a luta, alguns acampados viajaram para São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília, onde participaram de eventos de apoio à luta pela reforma agrária. Todavia, a situação das famílias no acampamento continuava crítica. Era necessário criar um fato novo, que fizesse avançar a luta. No Natal de 1981, a tristeza e a perseverança foram as mar­cas principais da celebração e já indicavam o esgotamento da resistência.
Em fevereiro de 1982, num encontro da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), os acampados propuseram à Igreja que comprasse uma área em Ronda Alta, para onde as famílias pudessem ser transferidas provisoriamente. Era uma forma de retomar a luta e continuar o enfrentamento com o governo, exigindo o assentamento no estado. Nesse mês, a CPT realizou a V Romaria da Terra e reuniu mais de 20 mil pessoas. A CNBB atendeu o pedido dos sem-terra, contribuiu e coordenou uma campa­nha nacional de arrecadação nas paróquias, para comprar a terra e transferir os acampa­dos. A Igreja Evangélica de Confissão Luterana também contribuiu e realizou a campa­nha em suas paróquias. Foi comprada uma área de 108 ha, próxima à Barragem do Rio Passo Fundo, no município de Ronda Alta, destinada ao assentamento provisório das famílias da Encruzilhada. A área foi denominada de Nova Ronda Alta.
No dia 12 de março, as famílias começaram a ser transferi das para o assentamen­to provisório. Em Nova Ronda Alta, organizaram-se em equipes de trabalho e comis­sões para continuar a pressão contra o governo. Todavia, mesmo dentro de seu territó­rio, os sem-terra continuaram a ser perseguidos pela Brigada Militar. No começo de abril, em torno de vinte brigadianos acamparam em uma ilha, a trezentos metros de Nova Ronda Alta e observavam o movimento do assentamento provisório. Durante mais um ano e meio, os sem-terra persistiram na luta. Com as eleições para governa­dor, discutiram com os candidatos a solução que defendiam para a questão da terra. Em setembro de 1983, o governador eleito autorizou a compra de 1.870 ha para o as­sentamento definitivo das famílias, nos municípios de Ronda Alta, Cruz Alta e Pal­meira das Missões. Também foram assentadas no estado 30 famílias que aguardavam no acampamento Quero-Quero, mas que desistiram de ir para Lucas do Rio Verde (MT). Terminava aquela ação dos sem-terra, mas a luta pela terra continuava com os sentidos e significados da resistência e da persistência que marcaram a Encruzilhada. O governo militar foi derrotado e os camponeses deram uma lição de organização, contribuindo para a construção da democracia.
O Acampamento Natalino chegou a ter 601 famílias. Sendo que 142 desistiram e 252 foram para Mato Grosso. Para Nova Ronda Alta foram, provisoriamente, 207 fa­mílias, onde permaneceram dez famílias em uma área de 105 ha. As outras foram as­sentadas no município de Ronda Alta, nos assentamentos Nossa Senhora Conquista­dora da Terra e Vitória da União, e no assentamento Rincão do Ivaí, no município de Salto do Jacuí. Das famílias que foram para o projeto Lucas do Rio Verde (MT), em 1986 restavam apenas 15. As outras venderam os lotes e migraram para outras re­giões ou voltaram para o Sul. Desde a beira da estrada até o assentamento, os sem-ter­ra aprenderam a resistir. A resistência foi alimentada pelo apoio constante e pela or­ganização. O aprendizado da resistência foi uma das mais importantes lições de cida­dania na formação do Movimento.
Fonte: FERNANDES, Bernardo Mançano. A Formação do MST no Brasil. Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 2000 (páginas 49-60)

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